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J.R. Guzzo: ‘Em uma democracia séria, ministros do STF não se encontrariam com julgados pela Corte’

A jornalista Malu Gaspar acaba de revelar na sua coluna em O Globo que o futuro presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, se encontrou em Lisboa, durante “eventos” diversos (é assim que se chamam hoje em dia essas coisas que não se sabe direito o que são: “eventos”), com dois pesos pesados da vida penal brasileira. Um é Joesley Batista. O outro é André Esteves.

Não podia, por uma questão elementar de compostura, ser visto com nenhum dos dois; cada vez que um negócio desses acontece, a impressão que fica é a pior possível. É ruim, por qualquer critério que se queira adotar, que um ministro do STF se encontre com bilionários enrolados com a Justiça. É pior ainda quando esse mesmo ministro está escalado para presidir a partir de setembro a mais alta Corte de Justiça do Brasil. É proibido por lei? Pode ser, pode não ser. Mas, com certeza, é o que as pessoas de bem chamam de “coisa que não se faz”. Talvez seja até pior.

É ruim, por qualquer critério que se queira adotar, que um ministro do STF se encontre com bilionários enrolados com a Justiça.

A história toda é uma lástima. Um dos encontros de Barroso, com o delator premiado e empresário Joesley Batista, ocorreu num coquetel – parte de um dos seminários seriais que seu colega Gilmar Mendes promove em Lisboa, na qualidade de sócio de uma faculdade particular de Direito em Brasília. Existe uma coisa dessas em alguma democracia séria do mundo – o cidadão ser ao mesmo tempo ministro da Corte Suprema e empresário no ramo do ensino privado? Não existe. Isso é coisa exclusiva do STF brasileiro – ou de algum desses tribunais de Terceiro Mundo que se multiplicam por aí.

O outro foi num jantar promovido pelo banqueiro André Esteves, que frequentou o sistema penitenciário brasileiro nos tempos em que a Justiça combatia a corrupção. O contato com Joesley, segundo Barroso, foi casual: ele estava no coquetel e, de repente o empresário apareceu. No caso de Esteves, não há o que dizer. O jantar era oferecido por seu banco, o Pactual – e ninguém vai por acaso a um jantar do Banco Pactual. Em qualquer das duas circunstâncias, Barroso não tinha nada de estar lá. Esses seminários, e jantares, e festinhas, e coisas que têm “patrocínio”, não são armados do mundo dos arcanjos. Existem para fazer exatamente o que fazem: promover contatos de primeiro grau entre julgadores e julgados. Não poderiam nunca estar juntos. É uma situação de incesto.

Barroso (e Gilmar) vêm se juntar ao ministro Alexandre de Moraes, que voltava de um “evento” desses, na Universidade de Siena, quando se viu envolvido no infausto caso do bate-boca no aeroporto de Roma. Moraes estava lá, como se sabe, por conta de um grupo empresarial que tem, entre diversos negócios, uma faculdade de Direito particular em Goiânia. Tem, também, um laboratório farmacêutico que fabrica ivermectina, faturou R$ 500 milhões com a venda da substância durante a pandemia e acaba de ser condenada na Justiça a pagar uma multa de R$ 55 milhões – no entender do juiz, ela explorou dolosamente os “tratamentos alternativos” para a Covid – tão ao gosto do ex-presidente Bolsonaro e tão amaldiçoados pela esquerda nacional e pelo STF.

É certo um magistrado fazer o que o ministro Moraes fez? Ele, o STF e Lula acham que sim – no seu caso, no caso de Barroso, no caso de Gilmar e em todos os casos. O que dá para dizer de concreto é que nenhum Tribunal de Justiça de Primeiro Mundo concordaria com eles.

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