Um coronel da Guarda Nacional devoto de São José

O Coronel Conservador do Pajeú.

Na escritura pública em que a família de meu tetra avô (Francisco Miguel de Siqueira) fez doação de terras à Paróquia da Ingazeira, descubro que meu ancestral recebeu ditas terras em nome do Patriarca São José. Ao ato notarial, o Frade Capuchinho Caetano de Messina fez questão de se fazer presente. Seu nome está registrado na escritura.

Esse documento público, em que consta que Francisco Miguel de Siqueira representou o Glorioso Padroeiro São José, e nessa condição recebeu as terras doadas, que hoje integram a sede do município da cidade da Ingazeira, é tão importante que vou me permitir transcrevê-lo, para provar o que pretendo, ou seja, Chico Miguel, muito provavelmente, era um devoto do Santo.

Segue o texto na íntegra da escritura pública.

“À margem esquerda no livro consta Cópia Patrimônio de São José da Ingazeira.

Escritura de doação de Patrimônio que fazem o Coronel Superior Agostinho Nogueira de Carvalho, João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lúcia de Britto, ao Patriarcha São José Padroeiro d´esta Villa de Ingazeira em presença do Rvdo Frade Mestre Fr. Caetano de Messina, P. da P. que a isto muito se importou.

Saibam quantos este público instrumento de Escritura de Doação e Patrimonio, ou como melhor nome e lugar haja para sua validade dizer-se passa, que sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Chisto de mil oitocentos e cinquenta e tres, aos vinte e quatro dias do mez de Novembro do dito anno, em meu cartório aparecerão o Commandante superior Agostinho Nogueira de Carvalho, João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Britto pessoas que as reconheço e faço as mesmas e dou fé, e por ellas foi dito em minha presença e das testemunhas ao diante nomeadas e abaixo assinadas, que sendo senhores e possuidores de parte de terra na Villa d´Ingazeira, e que estavão livres e desembargadas de todo o termo judicial, e que a possuíam por compra e herança de seus fallecidos paes, em cuja terra na povoação da dita villa farião doação para patrimônio da matriz do Snr São José Padroeiro do dito termo de Ingazeira da maneira seguinte, pegando da parte do norte, da barauna que está a porta da fazenda velha da Ingazeira, cortando para a parte do sul a passar pela parede da Sachristia da Igreja rumo direito de onde se contar trezentas braças e d´ahi para a parte do nascimento, com trinta e sete braças e meia e dahi cortará em rumo certo para o norte passando no oitão da casa do major Antonio Bernardes pela parte do poente de onde contar-se trezentas braças e d´ahi para o marco da barauna com trinta e sete braças e meia e assim estava extremado o patrimônio do Patriacha São José, sendo comprehendido n´esta doação sessenta palmos adoados por João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Britto e o mais pelo comandante superior Agostinho Nogueira de Carvalho, cuja terra assim extremada doarão e como de fato doado tinhão de hoje para sempre para patrimônio do Patriarcha São José, e por isso podiam tomar posse seus agentes e procuradores por si ou por authoridade de justiça e quer a tomem quer não lhes há por dado como posse real, cível e natural e pela clausula constituinte toda posse e domínio que nella tinhão tudo cedias nas pessoas dos procuradores da Igreja Matriz de São José de cujo Padroeiro fica sendo a dita doação como derão de suas livres e espontaneas vontades sem constrangimento de pessoa alguma e por isso mandarão os ditos doadores lavrar a presente escritura em que assignaram o Procurador do Patriacha São José o Tenente Coronel Francisco Miguel de Siqueira e os doadores João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Brito e o Coronel Agostinho Nogueira de Carvalho, presentes as testemunhas o professor Marcolino Antonio Xavier e o reverendo Joaquim Manoel Correa e Silva e eu Jeronymo Ferreira Coelho escrevão o escrevi. (Seguem assignaturas)

Agostinho Nogueira de Carvalho
João Francisco de Almeida e Silva
Maria Lucia de Britto
Pe. Joaquim Manoel Correa e Silva
Francisco Miguel de Siqueira (Procurador do Patrimonio)
Marcolino Antonio de Xavier

Convenço-me de que a devoção ao Patriarca São José era conhecida pelo Coronel Chico Miguel, como também pelos católicos do Termo da Ingazeira, porque, Santa Teresa d´Ávila, que viveu no século XVI, era devota do Patriarca. Nele tinha grande confiança. O Coronel viveu no século XIX, mais de dois séculos depois.

Meu convencimento extraio de um excerto do livro “Consagração a SÃO JOSÉ – As Glórias de Nosso Pai Espiritual, do Padre Americano Donald H. Calloway, isto é, no século XVI, já havia devoção ao Santo. Eis o que diz o religioso sobre a devoção da Santa ao Patriarca José:

“No século XVI, Santa Teresa d´Ávila auxiliou na reforma do ramo feminino da Ordem Carmelita. Ela tinha uma devoção enorme a São José e nomeou em sua homenagem a maioria dos conventos reformados. Para proteger os conventos (e suas monjas), enterrou medalhas de São José em volta deles como um sinal de que pertenciam a Deus e ao Santo”.

A confiança e devoção de Santa Teresa ao Patriarca São José está demonstrada na seguinte oração: “Tomei como advogado e protetor o glorioso São José, a quem me recomendei com todo o fervor de meu coração, e por quem tenho a certeza visível de ser ajudada. Esse terno pai de minha alma, esse amável protetor, apressou-se em me arrebatar do estado deplorável em que meu corpo definhava, à medida que me livrava de grandes perigos de outra natureza, os quais ameaçavam minha honra e minha salvação eterna”.

A devoção ao Patriarca São José – não há dúvida – remontava, fazia séculos, antes de Francisco Miguel de Siqueira, como demonstrado acima, na devoção de Santa Teresa d´Ávila. Logo, uma devoção que já existia, pelos menos, desde o século XVI, poderia ser conhecida – por evidente – no século XIX, tempo em que viveu Chico Miguel.

Colocadas essas premissas, tenho outros indícios através do quais me convenço de que Chico Miguel era devoto do Santo (Patriarca São José). E já o disse anteriormente em outros escritos. Quero reforçar com outros argumentos.

Na última vez que visitei a Igreja Matriz da Cidade da Ingazeira, constatei que, no templo, há uma peça de madeira (linha) com o nome de Francisco Miguel de Siqueira gravado. Prova cabal de que ele o construiu. Ou, no mínimo, deu importante colaboração para que a bela obra fosse realizada, e que aí está como prova. Demonstração clara que a fez (construção da Igreja Matriz da Ingazeira), como um ato de piedade Católica. Isto é um ato de fé e devoção aos valores eternos. Registrou para a posterioridade, no escopo de transmitir o que lhe movia nas suas ações.

Francisco Miguel de Siqueira, pelo que se sabe – seus detratores nada dizem sobre sua vida familiar – foi casado com Íria Nogueira de Carvalho. Com ela teve numerosa prole. Tiveram dez filhos. O varão morreu primeiro. Nada se diz contra a sua bem estruturada família. Este fato também é um indício de que seguia o modelo do Patriarca São José, que tem o título de sustentáculo das famílias, conforme ladainha (Ladainha de São José).

Há uma outra obra realizada na Vila da Ingazeira, em meados dos anos 50, do século XIX, que teve a mão de Francisco Miguel Siqueira. Refiro-me ao cemitério velho, construído para os que morreram com a cólera. Esse cemitério foi feito sob a liderança do Frei Serafim de Catânea. Não obstante, jornais da época fazem grandes elogios ao papel que teve o Coronel Francisco Miguel de Siqueira para que a obra fosse feita.

Ora, no século XIX – século em que viveu Chico Miguel – a construção de cemitérios era uma típica obra de piedade cristã, normalmente realizada por ocasião de missões de frades Capuchinhos. Ibiapina se tornou conhecido no Nordeste do Brasil como o religioso que construía cemitérios como obra de piedade. Isto também é indício de que Francisco Miguel de Siqueira, construiu o cemitério dos coléricos como um ato de devoção ao seu Santo Padroeiro (São José).

Francisco Miguel de Siqueira fazia questão de que seus escravos fossem casados na Igreja Católica. Já falei sobre essa questão em outro escrito. Como devoto de São José, acreditava no sacramento do matrimônio. Sabia Chico Miguel que “Jesus e Maria querem que você seja consagrado a São José porque não há pai ou marido que saiba mais sobre a santidade do casamento e da família ou o amor abnegado exigido dos pais e maridos do que São José”.

Por derradeiro, trago à liça outro indício que me causa muita impressão sobre a sensibilidade de Chico Miguel para perceber virtudes cristãs – muito embora um homem rústico.

Francisco Miguel de Siqueira teve cordial relacionamento com dois Frades Capuchinhos: Frei Caetano de Messina e Frei Serafim de Catânea. Chico Miguel ficou de tal forma impressionado com a santidade de Frei Caetano de Messina que convenceu sua família a doar terras para o patrimônio da Igreja Católica, conforme texto da escritura pública acima transcrita.

E aí estabeleço um paralelo desses dois frades Capuchinhos com os Padres que denegriram a memória de Chico Miguel (Pedro Pereira de Souza e João Vasco Cabral d´Algonez).

Na biografia de Frei Caetano de Messina (Estudo Histórico-Religioso), escrita por um jovem estudante de Direito, no ano de 1879, constato que o frade Capuchinho, em suas missões em Pernambuco, no Rio de Janeiro e em São Paulo, atraía multidões. Nele o povo sentida o odor de santidade.

Frei Caetano de Messina defendia o Império do Brasil e era amigo de D. Pedro II. Os Padres que macularam a honra de Chico Miguel eram revolucionários, simpatizantes da República francesa e das ideias liberais e anticlericais daquele tempo.

Fica explicado para mim o motivo pelo qual Chico Miguel (conservador) se aproximou dos Capuchinhos e não de seus detratores. Nesse aspecto Chico Miguel também revelava ser devoto de São José. Como filho espiritual do Patriarca, repudiava as ideias revolucionárias, que são materialistas.

Tópicos:

Nossa responsabilidade é muito grande! Cabe-nos concretizar os objetivos para os quais foi criado o jornal Diário do acre