Com frete 40% menor, Ferrogrão está parado no STF há três anos; entenda o caso

“Baita de uma evolução”. Foi assim que o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, classificou a sinalização feita pelo governo de que a Ferrogrão pode ter leilão de concessão ainda em 2026. O indicativo foi dado pelo diretor geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Guilherme Theo Sampaio, após participar de um evento que discutiu a questão ferroviária no Brasil promovido pela Abiove em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). 

“É superpositivo, porque vai demonstrar, realmente, que o governo está fazendo a parte dele evoluir. O TCU [Tribunal de Contas da União], às vezes, pode ser mais demorado, mas eu quero crer que, se a ANTT sinalizou isso, é que, de alguma forma, estão conversando com o TCU e pensando em um fluxo funcional”, comentou Nassar sobre o cronograma apresentado por Sampaio, que prevê a entrega ao TCU, até novembro, do novo traçado da ferrovia.

Porém, o presidente da Abiove coloca um ponto de atenção. Apesar dessa sinalização positiva, as atividades envolvendo a Ferrogrão dependem de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Até então, a autorização é apenas para que seja retomado o estudo de um novo traçado da via férrea. Isso não inclui a realização do leilão. 

“Pode acontecer da questão do STF ser um ponto de dúvida sobre a sequência do cronograma. […] Então, havendo conversas, interações entre o governo e o STF, eu acho que pode-se ter uma solução no Supremo também. Mas a solução do Supremo não está equacionada’, ponderou Nassar. 

Redução de custo de frete pode ser de até 40%

Na avaliação da CNA, esse aviso da ANTT é “a melhor notícia”. A assessora técnica da Comissão Nacional de Logística e Infraestrutura da CNA, Elisangela Pereira Lopes, lembra que o projeto da Ferrogrão está no STF desde 2021 e “sem perspectiva” de andamento. Um dos pontos que ela destaca sobre a importância do projeto é a redução de custo para produtores rurais da região do Mato Grosso, Pará e Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). 

Segundo ela, um estudo comparativo entre a atual rota de escoamento da safra e a alternativa da Ferrogrão aponta uma significativa redução no custo logístico. “Um dado muito interessante mostra que, se você utiliza a Ferrogrão e o Rio Tapajós, e compara com a rota existente hoje, a redução de custos é de 40%. Então, isso é visto com bons olhos”, acrescentou a assessora. 

Mesmo que o horizonte de conclusão da Ferrogrão seja de pelo menos dez anos, o presidente da Abiove vê que a realização do leilão pode baratear os custos do frete para produtores rurais dessa região.  

“O que vai acontecer é que, na hora que você faz o leilão, imediatamente você gera competição. Então, eu acho que, para o produtor, já vai beneficiar de cara. Porque só de anunciar e o projeto começar a andar, já vai gerar competição entre ferrovias”, destacou. 

Entenda o caso da Ferrogrão

O projeto da ferrovia que liga o porto de Miritituba (PA) ao município de Sinop (MT) começou efetivamente em 2016, com a etapa de estudos. De 2017 a 2020 ocorreu o período de consulta pública. A etapa seguinte seria a análise do Tribunal de Contas da União (TCU) para aprovar a regularidade do processo, mas está em andamento desde então.  

Em setembro de 2020, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6553 pedindo a suspensão dos “processos relacionados à Ferrogrão”. A alegação é de que a lei 13.452 de 2017 seria inconstitucional por diminuir o tamanho do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, além de prejudicar comunidades indígenas da região. A legislação relacionada ao parque foi feita a partir de uma medida provisória de 2016, na qual o objetivo era fazer essa alteração na área de conservação para acomodar o traçado da Ferrogrão. 

Desde então, o andamento para começar as obras da via férrea ficou judicializado. Em 2021, uma liminar do ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, determinou a suspensão dos efeitos da lei relacionada ao Parque do Jamanxim e do processo da Ferrogrão, ou seja, todas as etapas ficaram paralisadas, inclusive a análise pelo TCU.  

Em 2023, o caso teve um novo entendimento no STF. A Advocacia-Geral da União (AGU) fez uma petição para que a lei de 2017 fosse considerada inconstitucional, mas que fosse autorizada a retomada dos processos relacionados à Ferrogrão. A proposta da AGU era de que os estudos seriam refeitos observando a questão do parque e também dos povos indígenas. Com isso, houve uma nova liminar permitindo o retorno, mas condicionando “qualquer execução” do projeto à análise do STF. 

Atualmente, a ANTT diz já ter feito os novos estudos com o novo traçado. Dentro do processo judicial da ADI, um grupo, formado por associações civis e o partido político autor da ação, pede que o licenciamento ambiental envolvendo a Ferrogrão não seja feito enquanto não houver a finalização do processo administrativo. No autos, a AGU, com base em subsídio da ANTT, pondera que os estudos não podem ser “confundidos” com licenciamento ambiental. Esse procedimento de licença é feito pela empresa que ganhar o leilão de concessão, o que ainda não foi realizado. Sobre isso especificamente, ainda não há uma manifestação por parte do STF.

Como mostrado pelo Agro Estadão, a ANTT trabalha com o cronograma de publicar o edital do leilão até o primeiro semestre de 2026, com previsão de realizar o leilão ainda no próximo ano. No entanto, isso ainda depende do envio e análise no TCU.

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