Uma semana depois do bárbaro e covarde ataque terrorista do Hamas contra Israel, que deixou mais de mil mortos, fez milhares de feridos e resultou no sequestro de mais de uma centena de reféns, entre israelenses e estrangeiros, as forças armadas israelenses seguem contra-atacando. Uma invasão terrestre na Faixa de Gaza se torna cada vez mais provável; embora o prazo dado por Israel para que palestinos deixem a Cidade de Gaza, mais ao norte do enclave palestino, já tenha terminado, as tropas israelenses ainda não iniciaram uma invasão em massa até a tarde deste sábado (horário do Brasil), limitando-se a incursões pontuais em busca de reféns e para atacar instalações específicas dos terroristas.
Embora seja preciso rejeitar com veemência qualquer tentativa de estabelecer uma equivalência moral entre um grupo terrorista que tem entre os seus princípios a eliminação de Israel e um Estado que tem o direito de se defender da ameaça dos extremistas palestinos, por outro lado é preciso admitir que há a possibilidade de a resposta israelense também resultar em crimes de guerra e violações da lei internacional e do princípio da guerra justa. Deixar de observar as normas do Direito Internacional na resposta ao Hamas prejudicaria a posição israelense diante do restante do mundo, inclusive de países que condenaram inequivocamente o terrorismo palestino.
A lei internacional exige esforço máximo na distinção entre combatentes e civis, preservando estes últimos
Quando se afirma que Israel tem direito a uma resposta “proporcional” ao ataque terrorista, trata-se de aplicar os critérios consagrados por este princípio: a adequação, a necessidade e a “justa medida”. Não se trata de comparar números: se Israel usar um arsenal muito mais potente que os foguetes do Hamas, se invadir Gaza com um efetivo muito maior que o dos extremistas, e mesmo se matar muito mais terroristas que as 1,2 mil vítimas do ataque em Israel, nem assim a ação deixaria de ser proporcional – desde que ela se dedicasse única e exclusivamente a eliminar a ameaça do Hamas. O que fará a diferença entre a resposta proporcional e o crime de guerra é o efeito sobre a população civil.
A esse respeito, que ninguém se engane quanto às intenções do Hamas de usar a própria população palestina como escudo humano. Os terroristas não se importam com crianças e mulheres palestinas mortas porque os cadáveres servem duplamente a seus interesses, como meio de recrutar palestinos em busca de vingança e como ferramenta na guerra midiática contra Israel. A prática do Hamas de misturar seus quartéis-generais e locais de armazenamento de armas com instalações civis, incluindo hospitais, escolas e creches, é em si criminosa. Com isso em vista, passa a fazer sentido a opção pela invasão terrestre precedida de um pedido para que a população da Cidade de Gaza se desloque para o sul do enclave – pedido, aliás, que o Hamas incentiva os palestinos a desobedecer. Um pente-fino para eliminar bases e armamentos do Hamas com o mínimo de mortes de civis só seria possível com a presença de soldados em terra, em vez de campanhas de bombardeio que já deixaram centenas de civis palestinos entre os mortos. Mesmo assim, há uma série de regras a seguir, como a garantia do direito ao retorno dos moradores uma vez encerrada a operação militar e a necessidade de as rotas de fuga não serem submetidas ao fogo israelense.
Muito mais questionável é o bloqueio total imposto por Israel, privando toda a Faixa de Gaza de itens essenciais como combustíveis, eletricidade e água potável. Mesmo considerando-se que a falta de energia elétrica prejudica o funcionamento da máquina de guerra do Hamas, seu efeito é muito mais deletério, por exemplo no caso de hospitais. E nem mesmo essa justificativa se aplicaria no caso de água, alimentos, medicamentos e outros itens de ajuda humanitária. A flexibilização deste bloqueio é tão urgente quanto a reabertura de ao menos uma das passagens fronteiriças de Gaza, a de Rafah, que conecta o território palestino ao Egito.
A guerra de Israel é uma guerra por sobrevivência contra inimigos que desejam sua destruição, e décadas de conflitos deram aos israelenses a experiência necessária para medir a intensidade de suas ações. Mas a barbárie sem precedentes do Hamas pode levar muitos chefes políticos e militares israelenses a sucumbir à tentação de transformar autodefesa em vingança indiscriminada. A lei internacional exige esforço máximo na distinção entre combatentes e civis, preservando estes últimos. Sem este esforço, Israel estará sacrificando civis palestinos inocentes, deturpando o exercício do seu direito de conter a ameaça terrorista, e minando a legitimidade de sua resposta.