A última morada de Chico Miguel

Eu ouvi falar no nome de Chico Miguel na infância pelo meu pai, mas sempre de forma vaga, sem que ele referisse algum parentesco meu com o personagem. Minha mãe não falava nada sobre sua família. Sabia algumas generalidades. Acho que nada ouviu de seu pai sobre seus parentes pelo lado paterno.

Nós brasileiros temos muito poucas preocupações com a questão da ancestralidade. Entre as pessoas mais humildes e desinformadas, no máximo, sabe-se quem foi o avô. Talvez isso seja uma das causas do nosso atraso. Desconhecendo-se a ancestralidade as famílias se tornam com vínculos muito frágeis.

Há uns dez anos ou um pouco mais, minha prima Andrée Perazzo me falou de Francisco Miguel de Siqueira. Informação que ela obteve no livro de Fernando Pires sobre Afogados da Ingazeira. No livro de Fernando Pires estava transcrita a informação sobre Francisco Miguel de Siqueira que constava do Livro de Tombo organizado pelo Padre Carlos Cottart.

A informação era depreciativa sobre a memória de Chico Miguel. Adquiri o livro e li o que alí estava escrito sobre meu ancestral. Ao longo do tempo fui duvidando da veracidade daquela informação. Era a única existente sobre ele. Não havia nenhum outro depoimento sobre meu tetra-avô.

Fui pesquisando sobre esse ancestral pelo lado materno. Buscando pequenos retalhos. Numa cópia de escritura velha da aquisição da Fazenda Riachão pelo meu bisavô, Antônio Perazzo, que me foi gentilmente cedida por Francisco Perazzo (Seu Perazzo) constatei que Francisco Miguel de Siqueira tinha assinado a rogo por Antônia Nogueira de Brito.

O Francisco Miguel de Siqueira que assinou a rogo era um neto, filho do Major Laurindo Ângelo d’Almeida e Silva e de dona Antônia Nogueira de Brito, esta filha de Chico Miguel.

Há 04 anos aproximadamente, fui a Ingazeira com o objetivo de visitar o túmulo de Francisco Miguel de Siqueira. Deram-me a informação de que estava para ser demolido. O Padre Luizinho impediu que o fizessem. Graças a Deus! Sabia – não sei como – que era um ancestral da família Perazzo.

Durante a pandemia eu mandei fazer uma placa, num estilo pedestal, e mandei colocar no túmulo dele, com o objetivo de deixar caracterizado que a família não perdeu o interesse pela memória do Tenente Coronel Francisco Miguel de Siqueira.

Mais recentemente adquiri um segundo livro do escritor Fernando Pires. O livro trouxe uma informação de quem teria propagado – e que ficou consignado no Livro de Tombo organizado pelo Padre Cottart–a informação negativa sobre a memória de Francisco Miguel de Siqueira.

Consta como o propagador da infâmia contra a memória de Francisco Miguel de Siqueira um padre chamado Vasco. Não me recordo do primeiro nome desse religioso.

A partir daí, para mim ficou claro o motivo pelo qual o Padre Vasco fez registrar no livro de Tombo da Ingazeira sua má vontade contra meu tetra-avô, denegrindo sua imagem perante seus descendentes e gerações vindouras.

O Padre Vasco, conforme relata Fernando Pires no seu livro, do púlpito, instigava a população contra as autoridades constituídas do Império do Brasil. Era a favor de um movimento revolucionário chamado Quebra Quilos. Os líderes desse movimento não aceitavam o novo sistema de pesos e medidas introduzido pelo Governo Imperial.

Francisco Miguel de Siqueira era um defensor do Império do Brasil. Como Tenente Coronel da Guarda Nacional tinha o dever – jurou fidelidade à Constituição do Império do Brasil de 1824 – de defender o Império e as leis do país. Reprimiu o movimento revolucionário Quebra Quilos.

Tenho a impressão de que é Dr. Ulysses Lins que em seu livro As Três Ribeiras afirma que o promotor de Justiça de Flores depositava toda a sua confiança no Coronel Francisco Miguel de Siqueira no sentido de reprimir Quebra Quilos.

Diga-se de passagem que Francisco Miguel de Siquera não só reprimiu a desordem do movimento revolucionário Quebra Quilos, como também teve importante papel na repressão da Revolução Praieira no Sertão de Pernambuco. A inspiração da Praieira era a Revolução Francesa.

Chico Miguel estava sempre do lado da ordem. Seu mentor intelectual e político era seu primo o Monsenhor Joaquim Pinto de Campos, que foi deputado do Império por várias vezes, escritor notável – autor de uma biografia de Dom Pedro II – que nos legou uma extensa obra literária. Dele (Pinto de Campos) recebeu elogios.

Portanto, confio mais nos elogios que o Monselhor Pinto de Campos fez ao meu tetra avô Francisco Miguel de Siqueira, do que nas críticas levianas que lhe fez o Padre Vasco. Registre-se que o Padre Vasco por onde passou criou problemas. Falarei sobre isso em outra oportunidade. Isto é, quem foi o crítico de Chico Miguel.

Ainda dou mais crédito ao depoimento (silencioso) que lhe fez o Fr. Capuchinho Caetano de Messina. Este Santo (sua canonização está em trâmite) compareceu ao cartório da Ingazeira acompanhado da família de Francisco Miguel de Siqueira, para efeito de doação das terras que hoje pertencem ao Padroeiro São José.

O sogro de Francisco Miguel de Siqueira (Agostinho Nogueira de Carvalho), um genro e um filha fizeram a doação ao Padroeiro São José. Chico Miguel assina a escritura pública como procurador do Santo (São José).

Ora, alguém malvado como quer fazer crer o Padre Vasco – e Chico Miguel era o líder de seu clã –  não levaria sua família para fazer doação de terras à Igreja Católica. O Fr Capuchinho não confiaria também nas pessoas que estavam fazendo a doação. E diz a escritura que o Fr. Capuchinho muito se empenhou para que o ato fosse realizado.

Em síntese. Sobre Francisco Miguel de Siqueira dou preferência aos dois depoimentos desses dois religiosos. Monsenhor Pinto de Campos e o Fr. Capuchinho Caetano de Messina. Prefiro acreditar nos depoimentos desses dois religiosos do que no depoimento (registrado no livro de Tombo) do Padre Vasco.

Trago esses fatos à memória da família porque cheguei à conclusão de que a 1ª homenagem que devemos prestar ao Coronel Francisco Miguel de Siqueira é reconstruindo seu túmulo. Uma das obras de misericórdia corporal é enterrar os mortos. E os enterramos para preservar as suas memórias.

A importância de uma família se organizar com base na memória de um varão ilustre já era conhecida desde a antiguidade romana. O grande e poderoso império romano foi criado a partir dessa compressão da preservação da memória das famílias a partir de um nome de um personagem que teve uma biografia respeitável.

Trago à colação essa informação, extraída do livro Uma Visão Cristã da Economia de Mercado, de Dr. Adolpho Lindenberg, recentemente falecido. Eis o texto abaixo:

“Na antiguidade, um grupo de famílias com um antepassado varão comum e que praticava a mesma religião constituía uma gens ou clã patrilinear – p. ex., a gens Fábia, a gensCornelia. Por sua vez, as várias gentes formavam uma cúria. O agrupamento destas associações de descendentes conduziu a formação de tribos, que se reuniram e se transformaram em cidades e, por último, deram origem a um Estado”.

Foi assim que nasceu o poderoso Estado Romano. Dou esse exemplo para que tenhamos a noção da importância de nos mobilizarmos para resgatar a memória de Francisco Miguel de Siqueira, o mais importante personagem que deu origem ao nosso clã.

À guisa de conclusão, direi que os descendentes de Francisco Miguel de Siqueira têm o dever de dar-lhe uma digna última morada!

Esse dever também é extensivo aos moradores da cidade de Ingazeira, como de resto de toda a população dos municípios que se formaram a partir da cidade mãe, já que Chico Miguel, como líder regional, teve um importante papel na formação histórica do Vale do Pajéu. 

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