Li, no Diário do Acre, artigo do amigo Valterlúcio Bessa Campelo, sobre à questão da ANISTIA, que, em que pese ser uma pauta da oposição, deveria ser apoiada por todos que ainda têm o sentimento da compaixão.
O tema da anistia não é de direita nem de esquerda. É uma proposta que deveria ser apoiada por todos aqueles que conseguem discernir o que é justo e o que é injusto. Enfim, dos que possuam o mínimo da virtude moral do sentimento de justiça.
Eu já vinha cogitando de me manifestar sobre esse tema, que julgo o mais importante para que possamos pacificar o país, especialmente depois que a luta política se radicalizou com as eleições presidenciais de 2022. O artigo de Valerlúcio Campelo me provocou para sair do comodismo.
Não posso deixar de dizer que, uma entrevista dada pelo deputado federal Luiz Philippe de Orléans e Bragança tenha provocado em mim uma grande indignação. Relatou que ouve entre seus pares (deputados federais), aqueles que querem tirar partido (vantagem), dessa tragédia que atingiu centenas de brasileiros inocentes.
Deputados federais que, ao serem abordados sobre sua posição com relação à anistia, uma questão de direitos humanos (e de humanidade mesmo), indagam o que vão ganhar com o seu voto. Algo asqueroso! Deputados que ali (no parlamento) não deveriam estar. Homens com o caráter totalmente deformado, e que querem tirar proveito da tragédia de inocentes.
Pois bem. Em 1979 eu estava em Recife. Estudante de Direito na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e Ciências Econômicas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Acompanhei a chegada ao Brasil dos que foram beneficiados pela Lei de Anistia proposta pelo Presidente João Batista Figueiredo.
A Lei de Anistia é a designação popular da Lei nº 6.683, sancionada pelo Presidente João Batista Figueiredo, em 28 de agosto de 1979. Essa lei beneficiou muitos brasileiros que estavam exilados no exterior, e que voltaram ao Brasil graças a referida lei. Lembro-me da chegada, especialmente de 04 (quatro) pernambucanos ilustres: Miguel Arraes, Gregório Lourenço Bezerra, Francisco Julião Arruda de Paula e Paulo Freire.
Jovem universitário, compareci ao famoso comício de Miguel Arraes de Alencar no bairro de Santo Amaro. Miguel Arraes de Alencar havia voltado do exílio depois de 14 (quatorze) anos. Ao comício compareceram mais de 60 mil pessoas. Especialmente os jovens. Eu ali estava, juntamente com milhares de estudantes pernambucanos, demonstrando todo meu regozijo com os que haviam sido anistiados.
Eu tive oportunidade de conhecer os quatro famosos anistiados de Pernambuco: Miguel Arraes de Alencar, Gregório Lourenço Bezerra, Francisco Julião Arruda de Paula e Paulo Freire. A anistia de 1979 foi um momento propício para redemocratização, avanço de debates sobre liberdades, enfim, para se discutir os novos rumos do país.
Em 1979 eu era um jovem simpatizante da esquerda. Havia participado do Congresso de reestruturação da União Nacional dos Estudantes Brasileiros – UNE, em Salvador, Bahia.
O PDT (Partido Democrático Trabalhista), de Leonel Brizola estava se organizando em Pernambuco pelas mãos do ex-deputado federal José Carlos Guerra e Francisco Julião.
Como simpatizante da esquerda, ainda tive oportunidade de ouvir o líder camponês Francisco Julião em reuniões de organização do PDT. Fala mansa, recomendava: “trabalhador, entre para o sindicato rápido como quem risca um fósforo”. Velha estratégia comunista, ou seja, organização política pelos sindicatos.
Com relação ao também famoso anistiado Paulo Freire, eu já tinha comigo sua obra mais famosa: “Pedagogia do Oprimido”. Nunca consegui ler. A leitura não me agradava, mas, eu seguia à esquerda. Não podia discordar; só aplaudir.
Tive oportunidade de ouvir Paulo Freire uma única vez, quando fez uma palestra na Universidade Federal de Pernambuco, creio que ainda em 1979. Relatou como saiu do Brasil com sua esposa (Elza). Salvo engano morou inicialmente no Chile e depois passou pela África. Não me recordo se disse ter morado naquele continente. Mas lá esteve assessorando governos comunistas. Asseguro que ouvi isso.
Com relação ao comunista Gregório Lourenço Bezerra, já era um idoso em 1979. Nasceu na cidade de Panelas, no interior de Pernambuco, em 13 de março de 1900. Sua primeira prisão deu-se quando tinha 17 anos, por participar de uma manifestação de apoio à Revolução Bolchevique.
Sua militância política começa aí, em 1917. Mas, me adianto alguns anos e constato que em sua biografia, no ano de 1935, participou da “intentona comunista”. Foi condenado a 28 anos de prisão pela morte do tenente Sampaio Xavier e por ter ferido o tenente Aguinaldo Oliveira de Almeida.
Crimes praticados no Recife. Foram mortas mais de 100 pessoas durante a intentona no meu Estado. Há quem afirme que militares foram mortos dormindo. Essa versão é contestada pela esquerda, mas ela existe.
Foi anistiado logo depois do Estado Novo. Não só foi anistiado. Voltou a participar da vida pública, se elegendo deputado federal por Pernambuco em 1946.
Em 1964 Gregório Bezerra foi preso e condenado a 19 anos de reclusão. Foi libertado em 1969, juntamente com outros 14 presos políticos, em troca do Embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick, sequestrado por um grupo armado. Voltou para o Brasil em 1979, com a anistia concedida pelo Governo Figueiredo.
Eu tive oportunidade de assistir ao lançamento das memórias de Gregório Bezerra em Recife, que foi ditada pela editora Boitempo. O que presenciei no evento, inclusive da minha parte, era que havia uma total simpatia pelo velho comunista. Todos ali estavam felizes com a anistia concedida aos presos políticos.
Presos políticos que, como Gregório Bezerra e tantos outros que participaram da luta armada contra o regime militar, cometeram crimes graves.
Não me recordo da forma como tomei conhecimento desse fato. Acho que nas redes sociais. Uma senhora, com mais de 65 anos, que estava em Brasília no dia 08 de janeiro de 2023, acreditava que estava participando de um evento político de forma absolutamente pacífica. Foi surpreendida pela baderna – e os baderneiros devem ser punidos como tal -, que aconteceu de forma inusitada para ela. Assim tomei conhecimento desse fato.
Não foi presa – e que poderia ter sido condenada a uma pena próxima de 17 anos – porque, advertida por uma amiga, não entrou em um dos ônibus que supostamente, como prepararam o ardil, estaria lhe levando para um local seguro, antes de voltar para sua cidade.
Recordo que o general Dutra afirmou em CPI que as pessoas pensavam que estavam sendo protegidas; quando, na realidade, estavam sendo presas.
Muitas pessoas detidas pelo ato de 08 de janeiro, hoje condenadas, com certeza, estavam participando das manifestações com o mesmo grau de compreensão da senhora acima referida. A senhorinha de 65 anos poderia estar presa como golpista.
Fico estarrecido quando escuto determinadas personalidades, de quem se esperava o mínimo de compaixão com a tragédia de muitas pessoas que hoje estão presas e condenadas com penas altíssimas, e que estavam crentes de estarem participando pacificamente de um movimento político, dizerem: “SEM ANISTIA”!
Não consigo entender a falta de compaixão dos que dizem “Sem Anistia”, mesmo vendo a imagem da velhinha dona Ilda portando uma Bíblia e outros casos mais comoventes de pessoas presas pelo suposto “golpe”!
Precisamos sair do nosso comodismo e cobrarmos dos nossos parlamentares que se comprometam em votar pela ANISTIA dos que participaram do 08 de janeiro de 2023!
É uma questão de humanidade!