Um dos grandes bancos brasileiros chegou à conclusão, já em fevereiro, que o Brasil vai fechar este ano com recessão — mais exatamente, a economia vai recuar 0,5% até dezembro. Como é que eles sabem isso, se o ano nem começou? É o tipo de pergunta que não adianta nada fazer, porque nunca dão uma resposta coerente para ela; são previsões da ciência econômica, diriam os autores da profecia, coisa que é privativa dos economistas de grandes bancos e a respeito da qual não cabe ao leigo se manifestar.
Tudo bem, mas o que realmente interessa saber, nessa espécie de adivinhações, é o seguinte: elas são feitas sem nenhuma responsabilidade, sem nenhum compromisso e, sobretudo, sem nenhuma consequência para quem as coloca em circulação junto ao público pagante. Têm de ser recebidas, assim, com o grau de confiança que se reserva para os búzios do Pai João e as cartas de tarô da Mãe Joana. É simples: se der tudo errado, e a realidade mostrar-se o contrário da previsão, não acontece nada para o economista-previsor. Não perde o emprego. Não é nem chamado para uma pequena conversa na sala do chefe. Na verdade, ninguém vai se lembrar em dezembro o que ele disse em fevereiro — com um pouco de jeito, o cidadão pode até ir dizendo, aqui e ali, que previu outra coisa, ou mesmo o contrário. Em seguida, parte para a próxima previsão.
Vinda de onde vem, a estimativa de 0,5% de recessão não deveria, pensando um pouco, surpreender ninguém. Curiosamente, no Brasil de hoje, temos bancos de esquerda — e faz parte de seu compromisso social, sobretudo num ano de eleições, dizer que a economia nacional está em ruínas e dar a entender que o “campo progressista” vai devolver ao sistema econômico a felicidade que ele perdeu com o governo de direita. São bancos assim que fazem previsões como essa. Ou, então, pagam campanhas de publicidade contra a pecuária brasileira. Ou têm, na voz de gente que está em suas vizinhanças, candidatos à Presidência da República.
A saída possível, para o cidadão comum, é olhar para a realidade do dia a dia e acreditar naquilo que vê, e não naquilo que lhe dizem os economistas dos grandes bancos. Pode anotar, por exemplo, que justamente em janeiro de 2022, com a previsão de recessão, o investimento estrangeiro direto no Brasil foi de US$ 5 bilhões, o maior desde 2018; as contas mostram que podem ser US$ 10 bilhões em fevereiro. Se o país está morto, por que gente de fora está investindo tanto dinheiro aqui? Não dá para entender — mas leigo não tem mesmo que entender essas coisas, certo? Esperemos, então, pelos fatos.
J.R. Guzzo
*J.R. Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.
**Os textos do colunista não expressam, necessariamente, a opinião do Diário do Acre.
Por J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 24 fevereiro de 2022