​Chico Miguel: devoto do glorioso São José​

Casamento de Escravos na Ingazeirea.

Em uma escritura pública transcrita no Livro de Tombo organizado pelo Padre Carlos Cottart, tomei conhecimento de que a família de Francisco Miguel de Siqueira, em Missão realizada no ano de 1853, pelo Frade Capuchinho Caetano de Medina, doou ao Patriarca São José as terras que hoje constituem a sede do Município da cidade da Ingazeira.

A partir dessa informação – Francisco Miguel de Siqueira como Procurador do Patriarca São José – me ocorreu a ideia de obter mais informações sobre essa devoção à Sagrada Família. Li o livro “Os Ensinamentos de Nazaré”, do Padre Júlio Maria de Lombaerde. Aliás, como muito gosto.

Buscando resgatar a biografia de Francisco Miguel de Siqueira – Procurador do Patriarca São José – terminei por me tornar devoto de São José. O livro acima citado que li com prazer, consolidou minha convicção de que a Sagrada Família deve ser o modelo. Recomendei a leitura aos meus filhos Laura e Antônio, de 12 e 7 anos, respectivamente.

Pois bem. Ao ato notarial compareceu o Frade Capuchinho Caetano de Medina – um verdadeiro Santo que está para ser canonizado – o sogro de Francisco Miguel de Siqueira, o Coronel Superior Agostinho Nogueira de Carvalho, o genro e sobrinho, João Francisco de Almeida e Silva, e a filha Maria Lúcia de Brito.

Francisco Miguel de Siqueira assinou o documento – escritura pública – como Procurador do Patriarca São José. Consta da escritura que o Frade muito se esforçou perante à família de Francisco Miguel de Siqueira para que houvesse a doação. Claro que interagiu com Francisco Miguel de Siqueira, vez que este além de parente dos doadores, era o Procurador do Patriarca São José.

Esse documento é uma prova tão contundente que deve ser conhecido por todos que ainda duvidam do relevante papel de Francisco Miguel de Siqueira para formação do município da Ingazeira. Segue sua transcrição:

“À margem esquerda no livro consta Cópia Patrimônio de São José da Ingazeira.

Escritura de doação de Patrimônio que fazem o Coronel Superior Agostinho Nogueira de Carvalho, João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lúcia de Britto, ao Patriarcha São José Padroeiro d´esta Villa de Ingazeira em presença do Rvdo Frade Mestre Fr. Caetano de Messina, P. da P. que a isto muito se importou.

Saibam quantos este público instrumento de Escritura de Doação e Patrimonio, ou como melhor nome e lugar haja para sua validade dizer-se passa, que sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Chisto de mil oitocentos e cinquenta e tres, aos vinte e quatro dias do mez de Novembro do dito anno, em meu cartório aparecerão o Commandante superior Agostinho Nogueira de Carvalho, João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Britto pessoas que as reconheço e faço as mesmas e dou fé, e por ellas foi dito em minha presença e das testemunhas ao diante nomeadas e abaixo assinadas, que sendo senhores e possuidores de parte de terra na Villa d´Ingazeira, e que estavão livres e desembargadas de todo o termo judicial, e que a possuíam por compra e herança de seus fallecidos paes, em cuja terra na povoação da dita villa farião doação para patrimônio da matriz do Snr São José Padroeiro do dito termo de Ingazeira da maneira seguinte, pegando da parte do norte, da barauna que está a porta da fazenda velha da Ingazeira, cortando para a parte do sul a passar pela parede da Sachristia da Igreja rumo direito de onde se contar trezentas braças e d´ahi para a parte do nascimento, com trinta e sete braças e meia e dahi cortará em rumo certo para o norte passando no oitão da casa do major Antonio Bernardes pela parte do poente de onde contar-se trezentas braças e d´ahi para o marco da barauna com trinta e sete braças e meia e assim estava extremado o patrimônio do Patriacha São José, sendo comprehendido n´esta doação sessenta palmos adoados por João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Britto e o mais pelo comandante superior Agostinho Nogueira de Carvalho, cuja terra assim extremada doarão e como de fato doado tinhão de hoje para sempre para patrimônio do Patriarcha São José, e por isso podiam tomar posse seus agentes e procuradores por si ou por authoridade de justiça e quer a tomem quer não lhes há por dado como posse real, cível e natural e pela clausula constituinte toda posse e domínio que nella tinhão tudo cedias nas pessoas dos procuradores da Igreja Matriz de São José de cujo Padroeiro fica sendo a dita doação como derão de suas livres e espontaneas vontades sem constrangimento de pessoa alguma e por isso mandarão os ditos doadores lavrar a presente escritura em que assignaram o Procurador do Patriacha São José o Tenente Coronel Francisco Miguel de Siqueira e os doadores João Francisco de Almeida e Silva e sua mulher Maria Lucia de Brito e o Coronel Agostinho Nogueira de Carvalho, presentes as testemunhas o professor Marcolino Antonio Xavier e o reverendo Joaquim Manoel Correa e Silva e eu Jeronymo Ferreira Coelho escrevão o escrevi. (Seguem assignaturas)

Agostinho Nogueira de Carvalho

João Francisco de Almeida e Silva

Maria Lucia de Britto

Pe. Joaquim Manoel Correa e Silva

Francisco Miguel de Siqueira (Procurador do Patrimonio)

Marcolino Antonio de Xavier

Em atestado de verdade, o Jm. JH. Po Jeronymo Ferreira Coelho”.

O documento acima citado é indício muito forte de que Francisco Miguel de Siqueira, Procurador que era do Padroeiro São José, muito provavelmente, era um devoto do Santo e da Sagrada Família. Esse fato, por si só, confirma o que eu já havia dito em outro texto que escrevi falando de sua formação católica.

“Diz-se que a devoção a São José cresceu ao longo dos séculos, especialmente a partir do século XV, quando o Papa Sisto IV instituiu sua festa na Igreja Católica. São José é conhecido como um modelo de virtude para os cristãos, e é invocado como protetor das famílias, dos trabalhadores e dos moribundos”.

De forma que em 1853, quando Chico Miguel era Procurador do Patriarca São José, a devoção ao Santo e a Sagrada Família já tinha uma tradição de mais de três séculos. Convenço-me de que era devoto do Santo protetor das famílias e dos trabalhadores.

Dessa escritura pública ainda extraio outra conclusão, que me leva a crer da sua devoção ao Santo. O Frade Capuchinho Caetano de Medina era um missionário piedoso, considerado um apóstolo do Brasil, que está para ser canonizado, e que morreu no Uruguai com odor de santidade. Com ele o Coronel Chico Miguel teve boas relações.

O Coronel Francisco Miguel de Siqueira, conservador como era (líder do Partido Conservador do Império), não conseguiu ter boas relações com padres revolucionários, que são os que lhe atacam. São eles: Padre Pedro Pereira de Souza (líder do Partido Liberal), e Padre João Vasco Cabral d’Algonez, que defendia o movimento revolucionário denominado “Quebra Quilos”.

Francisco Miguel de Siqueira também teve excelentes relações com o Frade Capuchinho Serafim de Catânea, um homem piedoso. Sob a liderança desse Frade Capuchinho interagiu para realização de uma obra de piedade cristã que foi a construção do cemitério para os que morriam contaminados pela cólera que atingiu a Ingazeira na segunda metade da década de 1850, que vitimou, inclusive, sua mãe, dona Antônia Cunha de Siqueira.

Jornais da época, além dos elogios que fizeram ao Frade Serafim de Catânea, pela construção do cemitério dos coléricos, também fizeram rasgados elogios ao importante papel de Francisco Miguel de Siqueira. Despendeu inclusive recursos próprios para construção da obra.

Sobre o adversário político de Chico Miguel, Padre Pedro Pereira de Souza, o que consta no livro de Tombo organizado pelo Padre Carlos Cottart não lhe dignifica a biografia. Quis mudar a sede da paróquia da Ingazeira para Afogados em razão de seus interesses de fazendeiro. O que era uma prática reprovada para um religioso.

Sobre essa prática reprovável de religiosos que cuidavam de interesses mundanos, como era o caso do Padre Pedro Pereira de Souza, disse Caio Prado Júnior, referindo-se ao período colonial:

“Nem mesmo o padre é sempre um morador fixo do povoado. Comumente acrescenta às suas funções sacerdotais outras mais terrenas de fazendeiro ou minerador, coisa que espantava e horrorizava o piedoso Saint-Hilaire, que via o abandono espiritual em que deixava o seu rebanho de fiéis”. Era o caso do Padre Pedro Pereira de Souza.

Há ainda outro fato, documentalmente provado, de que Chico Miguel era um devoto de São José e da Sagrada Família, pela sua preocupação com o sacramento do matrimônio. Sobre a escravidão no Pajéu, destaco o seguinte trecho de artigo do Historiador Hesdras Siqueira:

“Chico Miguel foi um desses senhores de escravos que fazia questão que seus cativos contraíssem matrimônio. Há diversos registros de matrimônios de escravos nos livros de casamento da Ingazeira, alguns desses eram justamente os cativos do Coronel Francisco Miguel de Siqueira”.

Ora, em raciocínio mais apressado se pode dizer que Chico Miguel poderia incentivar o casamento dos seus escravos para aumentar o número de seus cativos. Errado. Se ele não valorizasse o sacramento (matrimônio), poderia fazer aumentar o número dos seus escravos sem incentivar o sacramento. Poderia incentivar relações ilegítimas.

Portanto, isso é mais um fato que me leva a convicção de que Chico Miguel era um devoto de São José e da Sagrada Família!

Por derradeiro, para corroborar minha tese de que Chico Miguel era um devoto de São José e da Sagrada Família, dou um testemunho pessoal. Quando reuni algumas reminiscências de família para compaginar no livro “Da Itália Para o Brasil: Os Perazzo em Pernambuco”, chegou ao meu conhecimento de que ao batizado de minha bisavó, Amélia Leopoldina de Almeida Pedroza, neta de Chico Miguel, ao ato esteve presente sua mulher Íria Nogueira de Carvalho, e o filho José Januário de Siqueira. A família valorizava os sacramentos.

Apesar da maledicência contra Chico Miguel assacada por adversários políticos, nada foi dito sobre sua família. Isto é, era um homem bem casado, pai de uma numerosa prole de 10 filhos. Um bom pai de família!

Segue link artigo Historiador Hesdras Siqueira sobre “Casamentos de Escravos na Ingazeira”.

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