A Medida Provisória nº 1.314/2025, que libera R$ 12 bilhões em crédito para renegociação de dívidas rurais de produtores afetados por desastres climáticos, contemplou municípios de perfil turístico e pesqueiro, como Balneário Pinhal (RS), Ubatuba (SP) e Mangaratiba (RJ), mas deixou de fora regiões de forte tradição agrícola, especialmente no Rio Grande do Sul. Entre essas localidades estão: Rosário do Sul, Bagé, Candelária, Júlio de Castilhos, Itaqui, Bossoroca, Quaraí e Butiá.
A lista de municípios habilitados foi publicada pelo Governo Federal na última terça-feira, 30. Segundo a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), os critérios de seleção provocaram distorções ao incluir balneários turísticos e excluir polos agrícolas atingidos por secas e enchentes nos últimos anos. A lista era aguardada por bancos e cooperativas para dar início às operações de renegociação de dívidas rurais.
“O problema é que os critérios não atendem. Eles deixam de fora municípios estratégicos para o agro e colocam dentro balneários, que são praias”, disse o economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz.
Em documento enviado ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, nesta quinta-feira, 2, a entidade disse que vê “com grande preocupação” os efeitos da regulamentação da MP — principalmente a elegibilidade de municípios beneficiados — e propôs ajustes para que as regras reflitam melhor a realidade produtiva.
De acordo com a portaria publicada pelo Mapa, o município só é considerado elegível se atender a dois requisitos. Primeiro, ter registrado perdas de pelo menos 20% em duas das três principais culturas agrícolas locais, em dois anos distintos, entre 2020 e 2024. Segundo, ter decretado situação de emergência ou calamidade pública no mesmo período. As culturas analisadas são definidas pelo IBGE, a partir da maior área plantada em cada município.
A federação sugere que sejam desconsideradas as lavouras de inverno, como a aveia, que têm grande área plantada, mas não refletem os impactos da seca sobre as safras de verão. Também propõe culturas irrigadas, como o arroz, que também acabam mascarando perdas de municípios atingidos pela estiagem.
Desta forma, seria elegível o município que tivesse registrado perdas de pelo menos 20% em duas das três principais culturas agrícolas locais de verão e de sequeiro.
Além disso, a federação também propõe que só sejam considerados elegíveis municípios que, entre 2020 e 2024, tenham registrado pelo menos duas perdas significativas em safras de verão e decretado três situações de emergência ou calamidade pública por razões climáticas.
Segundo o economista, as dívidas dos produtores do Rio Grande do Sul são estimadas em R$ 73 bilhões, dos quais R$ 27 bilhões estão estressados. Ou seja, em atraso, já prorrogados ou prestes a entrar em inadimplência.
A coordenadora do Movimento SOS Agro, Grazi Camargo, classificou o método do governo como “excludente”, por deixar de fora municípios afetados por estiagens e enchentes. Segundo ela, não é justo que produtores sejam barrados pela burocracia e, por isso, o movimento orienta que procurem a defesa civil de cada cidade para corrigir falhas. Grazi acrescentou que os critérios precisam ser revistos e defendeu um olhar “mais regionalizado e criterioso”.
Para o SOS Agro, além das sugestões da Farsul, outra alternativa seria permitir que conselhos municipais de agropecuária comuniquem ao Ministério da Agricultura e aos bancos quais calamidades ocorreram e quais culturas devem ser priorizadas.
O Mapa ainda não respondeu às sugestões da Federação. A reportagem do Agro Estadão também solicitou ao Ministério um posicionamento sobre os critérios estabelecidos e a possibilidade de ajustes, mas ainda não teve resposta.
Sistema Faep também cobra mudanças nos critérios
Conforme o Agro Estadão já mostrou, a Federação de Agricultura do Paraná (Faep) solicitou ao Conselho Monetário Nacional (CMN) a revisão dos critérios que regulamentam o acesso ao crédito de R$12 bilhões para produtores rurais atingidos por perdas climáticas no Estado. A entidade crítica a exigência de decretos municipais de emergência, que abrangem apenas 32% dos municípios paranaenses, e o uso obrigatório de dados estatísticos médios do IBGE, considerados inadequados para refletir a situação individual dos agricultores.
Início das operações de renegociação
Os bancos privados já estão autorizados a fazerem a renegociação com recursos livres. Já as negociações com recursos controlados, que têm juros estabelecidos pela MP, ainda dependem de ajustes de operacionalização nos bancos.
Segundo a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), as instituições ainda precisarão de cerca de 15 dias para adaptar os sistemas antes de liberar as operações. A entidade orienta os produtores a procurarem seus sindicatos e manterem contato com as instituições financeiras.



