Empresários estimam custos de até US$ 350 bilhões para mudanças nos sistemas de produção agropecuários

Representantes do setor Agro de 19 países e a União Europeia estão reunidos na Chapada dos Guimarães, em Mato Grosso, para tratar de uma declaração conjunta sobre os sistemas alimentares. O grupo de trabalho (GT) de Agricultura do G20 começou nesta terça, 10, as reuniões para a elaboração do documento. 

“Nós vamos fazer uma declaração, que é mais do que uma carta, porque a declaração tem compromisso de institucionalizar as decisões aqui tomadas”, disse o ministro da Agricultura e Pecuária (Mapa), Carlos Fávaro, aos jornalistas nesta terça. A expectativa é de que essa declaração seja divulgada até sábado, 14, e depois apresentada aos líderes mundiais no encontro do G20, no Rio de Janeiro, em novembro.  

O GT já teve 12 reuniões ao longo do ano e mais seis são esperadas nos próximos dias. A ideia é que a declaração dos ministros da Agricultura traga diretrizes para modificar e tornar os sistemas alimentares pelo mundo mais sustentáveis, além de garantir a segurança alimentar global. 

Nesse sentido, o B20 – braço empresarial do G20 – apresentou propostas que serão levadas como sugestões na elaboração desse documento final. Com empresários de diversos ramos, o B20 tratou do tema dentro da força-tarefa de Sistemas Alimentares Sustentáveis e Agricultura, liderada pelo CEO da JBS, Gilberto Tomazoni. O levantamento inicial feito pelo grupo apontou que serão necessários de US$ 300 bilhões a US$ 350 bilhões por ano para fazer a transformação dos sistemas produtivos no mundo. 

Uma das propostas do B20 é “criar modelos inovadores de financiamento e colaboração”. A recomendação traz ainda duas políticas práticas: garantir essa alocação de capital e monetizar os serviços ambientais, como práticas de agricultura regenerativa ou de redução do uso da água. Ao Agro Estadão, Tomazoni destacou que entre as sugestões que o grupo apresentou, o financiamento é o mais importante. 

“Eu diria que é uma recomendação crucial”, disse. O executivo ainda explicou que há três barreiras para a transformação dos sistemas alimentares: uma de cunho econômico, outra técnica e a social. No entanto, a barreira econômica é a mais sentida e importante na visão de Tomazoni. 

“O grande desafio mesmo é o desafio econômico, porque quando você adota essas práticas [sustentáveis] ou tecnologias avançadas, elas têm que ser acessíveis para o produtor. Segundo, que ela tem um tempo de maturação, porque quando você faz o investimento inicial, o fluxo de caixa inicial acaba sendo negativo, mas a gente sabe que no final vai gerar mais caixa. E terceiro, tem que ter seguro, porque o pequeno produtor fez um investimento, empenhou o seu capital e se vem uma safra ruim, um período ruim de tempo, coisas fora do controle dele, ele fica em maior dificuldade”, pontuou o CEO.

Essa contrariedade fica mais complexa quando se olha para as diferenças entre grandes e pequenos produtores, além das disparidades de produção entre os países. Para Tomazoni, isso passa pela “falta de segurança de como é que se vai pagar por um serviço regenerativo”, já que hoje há uma ausência de métricas para países de agricultura tropical, como o Brasil. 

“Hoje, apenas 4% dos investimentos na mitigação dos efeitos climáticos têm ido para a agricultura. E o mundo tem que entender que os sistemas alimentares podem capturar de 9% a 23% das emissões globais, então a agricultura é uma solução de curto prazo por problemas climáticos”.

Gilberto Tomazoni, CEO da JBS

Quais são as propostas dos empresários mundiais?

Além da questão do financiamento, o grupo para Sistemas Alimentares Sustentáveis e Agricultura do B20 apresentou mais duas recomendações, sendo que cada uma delas contém duas políticas direcionadas. 

  • “Fomentar o aumento de produtividade por meio do desenvolvimento e da ampliação de tecnologias sustentáveis”
  • “Fortalecer o sistema multilateral de comércio de alimentos e agricultura com a Organização Mundial do Comércio (OMC) no seu núcleo”

Na opinião do coordenador de Inteligência Comercial e Defesa de Interesses da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Felipe Spaniol, o “momento é oportuno para essa discussão” das propostas. Ele vê um clima receptivo por parte dos países para que essas sugestões sejam acatadas dentro da declaração final dos ministros da Agricultura. 

“Eu acho que o documento [com as propostas] foi bastante conciso e direto, o que torna mais fácil o entendimento dos pontos que estão ali colocados e possíveis desdobramentos para ações concretas, para que os líderes de governo possam tentar desdobrar isso em políticas públicas”, avaliou Spaniol. 

O texto final da declaração tem sido negociado pelo Brasil com os outros países e a expectativa é de que o documento esteja em sintonia com as propostas do setor empresarial. “Eu diria que tem um grande alinhamento do que o governo brasileiro vai defender [no GT] com as propostas do B20”, revelou o CEO da JBS. Na próxima quinta, 12, Tomazoni irá apresentar as recomendações do B20 para todos os ministros presentes no GT. Além disso, ele também espera ganhar mais apoio fazendo reuniões bilaterais com os representantes da Agricultura dos países onde a multinacional brasileira tem operações. 

Resistência maior deve ser com relação aos acordos multilaterais

O entendimento do coordenador da CNA é de que entre as três propostas do B20, a que deve exigir mais “diálogo e trabalho” é a questão do fortalecimento multilateral. Isso porque a OMC, que é quem regula o comércio global, está com os julgamentos parados devido à falta de indicação do representante dos Estados Unidos. Além disso, a legislação europeia, como a European Union Deforestation-Free Regulation (EUDR), também impede um discurso de mesma sintonia entre as nações mundiais. 

“A proposta é justamente combater as barreiras comerciais que estão sendo criadas, que são barreiras ambientais que impactam o comércio e que são discriminatórias, são punitivas e não respeitam as regras internacionais de comércio”, disse Spaniol. 

Sobre os regramentos da Europa, o coordenador vê margem para que haja um abrandamento dessas políticas. “A própria Europa tem muita incerteza em como essa legislação [EUDR] vai se sustentar”, afirmou.

Compreensão também do CEO da JBS, que defende uma regra que dê prioridade aos produtores com boas práticas. “Ao invés de penalizar deveria incentivar. São maneiras idênticas de promoção, mas que tem um resultado muito diferente”, ponderou. Além disso, Tomazoni defende que os alimentos deveriam ser livres das restrições tributárias. “O que a gente tem visto é que as barreiras tarifárias e não tarifárias são maiores em cima dos alimentos do que nos outros produtos, quando devia ser o contrário”, justificou. 

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