Francisco Miguel de Siqueira nasceu no início do século XIX e faleceu ainda no mesmo século (1878). Parte de sua vida no Brasil colônia (1801\1822), e o restante de sua vida no Brasil Império (1822\1878). Quando o Brasil obteve sua independência em 07 de setembro de 1822, o Coronel ainda era um jovem com 21 (vinte e um) anos, ou 22 (vinte e dois) anos incompletos.
A vida pública do Coronel Francisco Miguel de Siqueira, provavelmente, se inicia já o Brasil como país independente, na condição de uma Monarquia constitucional parlamentar. Foi um homem que viveu intensamente o período monárquico, a quem foi um fiel aliado como conservador.
Chego à conclusão de sua admiração pelo Império do Brasil a partir dos nomes de minha trisavó (Leopoldina Lina de Siqueira), uma dos 10 (dez) filhos do Coronel, e da minha bisavó (Amélia Leopoldina de Almeida Pedroza), filha única de Leopoldina Lina de Siqueira e do Tenente Francisco Cassimiro de Almeida Pedroza.
Adotou os nomes das princesas do Brasil. Leopoldina (Leopoldina de Bragança), foi a segunda filha de D. Pedro II, e Amélia (Maria Amélia de Bragança), a única filha do segundo casamento de D. Pedro I. Fica claro que Francisco Miguel de Siqueira tinha simpatia e fidelidade para com o Imperador do Brasil. Demonstrou sua simpatia com a Monarquia em outras situações que destaco abaixo.
Na sua vida pública, com certeza, Francisco Miguel de Siqueira interagiu com muitos religiosos. Mas, agora, destaco o relacionamento que travou com 04 (quatro) religiosos que tiveram influência na sua biografia. Dois pelo do bem, e dois que macularam o seu nome ao longo dos últimos mais de 150 (cento e cinquenta) anos.
O que direi dos dois religiosos que macularam a memória de Chico Miguel não tem como objetivo falar mal da Igreja Católica. Pelo contrário! Creio firmemente que A Igreja Católica é Santa. É a Nossa Mãe. Quero dedicar minha vida e educar meus filhos inspirado nos seus divinos mandamentos.
Porém, a Igreja é composta de seres humanos que cometem erros. E os erros de muitos religiosos do tempo em que viveu nosso personagem foram graves. Não sou eu que estou dizendo. Quero me valer aqui para confirmar o que digo no que relatou Caio Prado Júnior no seu livro interpretativo do Brasil, sob o título “Formação do Brasil Contemporâneo”, que acabo de ler.
Disse acima que Francisco Miguel de Siqueira viveu no Brasil Colônia e no Brasil Império. Vejamos o que o autor acima citado diz como era a conduta do Clero no Brasil Colônia, e que não mudou muito no decorrer do período Imperial, em que viveu meu tetra avô.
São palavras de Caio Prado Júnior, à página 299, do livro citado, da editora Brasiliense, 2.000: “Nem mesmo o padre é sempre um morador fixo do povoado. Comumente acrescenta às suas funções sacerdotais outras mais terrenas de fazendeiro ou minerador, coisa que espantava e horrorizava o piedoso Saint-Hilaire, que via o abandono espiritual em que deixava o seu rebanho de fiéis”. Negritamos.
À fl. 344, disse o autor citado: “Mas noutro terreno, no seu teor moral médio, a massa do clero não se destaca muito acima de seus colegas da administração leiga. A mercantilização das funções sacerdotais tornara-se pela época em que nos achamos um fato consumado. Citei já a observação de uma autoridade eclesiástica, que reconhece ter se tornado a batina um simples “modo de vida”, um emprego, parecendo aliás perfeitamente conformado com o fato”, Negritamos.
Continua o autor falando do que era o clero: “…muitos são fazendeiros: era eclesiástico o melhor farmacêutico de São João del-Rei, e preparava e vendia ele próprio suas drogas; um outro sacerdote vendia tecidos no balcão de sua loja”. Negritamos.
Eu poderia continuar citando muitas passagens do livro de Caio Prado Júnior para demonstrar o despreparo moral da maioria do clero – a falta de vocação mesmo – no tempo em que viveu Francisco Miguel de Siqueira. Mas, para não ser repetitivo citarei a última à guisa de demonstração do que era o clero no tempo do Coronel: “A grande maioria do clero, secular e regular, desde os mais altos dignitários até os mais modestos coadjutores, deixava-se ficar numa indiferença completa de tais assuntos, usufruindo placidamente suas côngruas e demais rendimentos, ou suprindo a deficiência deles com atividades e negócios privados”. Negritamos.
Demonstrado o que era o clero no tempo em que Francisco Miguel de Siqueira viveu (Brasil Colônia e Brasil Império), volvo os olhos para a Vila da Ingazeira no mesmo período, ou seja, no tempo de Brasil Colônia e Brasil Império. Eis abaixo um perfil biográfico (não feito por mim) dos dois padres que denegriram a imagem de Francisco Miguel de Siqueira para as gerações que o sucederam.
Um dos detratores do Coronel Francisco Miguel de Siqueira foi o Padre Pedro de Souza Pereira. Há um fato folclórico, atribuído ao Coronel, em que é protagonista o Padre acima citado, e está relatado pelo escritor Fernando Pires, no livro “Afogados da Ingazeira Páginas de sua História. Supostamente seria o início do desentendimento com o religioso. Eis o que disse Fernando Pires:
“Conta-se que o coronel Francisco Miguel de Siqueira, com sua prepotência, exigiu do Padre Pedro Pereira, último pároco da Ingazeira, que lhe aguardasse para iniciar a missa porque havia chegado de viagem e necessitava descansar. Claro, o padre não o atendeu. Os vigários não gostavam da Ingazeira, por causa da soberba das famílias ali reinantes”. Negritamos.
Na realidade não eram os padres que não gostavam da Ingazeira. Era o Padre Pedro de Souza Pereira que tinha motivos (políticos e privados) para não gostar da Ingazeira. Era político e membro do partido liberal. Foi prefeito em Afogados da Ingazeira onde também era fazendeiro.
Francisco Miguel de Siqueira era um adversário político do religioso. O coronel conservador; o religioso revolucionário. Não esqueçamos que o liberalismo era uma doutrina anticlerical que inspirou a Revolução Francesa. O padre estava no lugar errado (do ponto de vista dos Evangelhos), e Francisco Miguel de Siqueira defendendo os valores cristãos que o Padre deveria defender, mas não o fazia.
Transcrevo agora – extraído do livro de Fernando – o perfil biográfico do Padre Pedro de Souza Pereira, traçado pelo Padre Carlos Cottart:
“10 de outubro de 1910: Falecia o Pe. Pedro de Souza Pereira em Afogados da Ingazeira. Seus restos mortais estão sepultados na Catedral do Senhor Bom Jesus dos Remédios. O Padre Pedro era descuidado, e a sua administração paroquial foi negativa; nem Sacrário existia na matriz que consistia numa capela de taipa, baixa e sem estilo.
Na visita de 1896, deixou o visitador escrito no livro de Tombo observações graves e o altar mor ainda sem Sacrário e Santa Reserva; os livros irregulares, os vasos para os Santos Óleos imprestáveis, o ensino religioso nulo, a Igreja indecente por sua categoria de Matriz. E alguns, ao reparar essa negligência, observarem que o altar não passava de balcão de negócios do vigário”. Negritamos.
Esse perfil biográfico acima traçado do Padre Pedro de Souza Pereira – repito que não foi por mim – mas por um religioso com toda credibilidade (Padre Carlos Cottart), e não é meritório para o Padre que denigriu a memória de Francisco Miguel de Siqueira. Muito pelo contrário! Confirma tudo que Caio Prado Júnior dizia da moralidade do Clero no período de Brasil Colônia e, por conseguinte, no período Monárquico em que viveu o Coronel.
O que o Padre Pedro de Souza Pereira disse do Coronel Chico Miguel não merece credibilidade. Era a opinião de um adversário político que, sequer, estava alinhado com o magistério da Igreja. Como político defendia ideias revolucionárias e anticlericais, contrárias (repito) ao magistério da Igreja Católica.
Agora vejamos o que disse o outro religioso que maculou, perante a história, a biografia do Coronel Chico Miguel. Quero me referir ao Padre João Vasco Cabral d’Algonez. Extraio do livro do escritor Fernando Pires a queixa do referido Padre contra Chico Miguel, e rebato a queixa do aludido Padre com o que está dito no mesmo livro.
Eis a crítica do Padre João Vasco Cabral d’Algonez contra meu ancestral: “23 de outubro de 1877: O coronel Francisco Miguel, chefe político da Ingazeira, sempre insultava os padres que se estabeleceram na Ingazeira. Nesse dia agrediu, na Igreja, o Padre João Vasco, que saiu chorando da povoação. O padre foi para o Recife, entregando a freguesia ao capelão de Afogados, padre Pedro de Souza Pereira”. Negritamos.
João Vasco Cabrarl d’Algonez é o segundo religioso que passou pela Ingazeira e que maculou a memória de Chico Miguel. E o motivo? Era um adversário político. O que disse contra o antigo chefe político da Ingazeira não merece credibilidade. Extraio do livro de Fernando Pires, intitulado “Afogados da Ingazeira – Páginas da Sua História”, editado pela Editora Nova Presença, 2021, o que as autoridades da Ingazeira diziam contra o Padre João Vasco Cabral d’Algonez :
“Devo informar a V. Exª. Que o vigário desta freguesia, João Vasco Cabral d’Algonez, em suas prédicas (sermões), feitas todos os domingos na missa conventual, vive concitando o povo à revolta e a não obedecer ao governo”. Negritamos.
É uma mensagem oficial dirigida ao líder da Província de Pernambuco. Uma denúncia gravíssima de facciosismo. Um crime contra o Estado Brasileiro.
Ora, Chico Miguel era um defensor da ordem. Um defensor da legalidade do Império do Brasil. O Padre Vasco era um revolucionário, que instigava o povo contra o governo do Império, especialmente no movimento denominado “Quebra Quilos”, que o militar tinha o dever de combater. Chico Miguel ao assumir o Comando da Guarda Nacional de Flores em 1870, tinha como uma de suas atribuições a manutenção da ordem. Eis o motivo da insatisfação do Padre João Vasco. Reforço o argumento com um texto do livro acima citado:
5 de janeiro de 1870: “Ao comandante superior da Guarda Nacional de Flores – Comunico à V. Sa. para os devidos fins, que, segundo consta do Diário nº 241 deste mês, houve sua Majestade, o Imperador, por bem, reitegrar por decreto de seis do corrente, no lugar de chefe do Estado Maior desse comando superior o tenente-coronel Francisco Miguel de Siqueira”. Negritamos.
Ainda extraído do livro de Fernando Pires. No mesmo ano de 1870 quando foi nomeado pelo Imperador como Comandante da Guarda Nacional em Flores, Chico Miguel foi nomeado Juiz Municipal e de Órfãos da Ingazeira. Logo, seu papel era combater os movimentos contra a ordem. O Padre Vasco promovia à desordem que Chico Miguel, por dever de ofício, estava obrigado a combater.
Eis o motivo da insatisfação do Padre Vasco, e o motivo pelo qual denegriu – sem direito de defesa – a memória do Coronel Francisco Miguel de Siqueira.
Portanto, são esses dois padres acima citados que ofendem à honra do Coronel Chico Miguel que, pelos cargos que ocupou, merecia a consideração do Imperador do Brasil, Dom Pedro II. Eu prefiro o atestado de boa conduta que lhe dava o Governo do Império. Seu primo, Monsenhor Pinto de Campos, parlamentar e escritor notável, também o elogiou.
Destaco, finalmente, os religiosos com quem o Coronel interagiu para fazer obras de grande importância para a comunidade da Ingazeira, recebendo elogios por tais atividades, elogios registrados em jornais da época.
O primeiro dos dois é o Frade Capuchinho Caetano de Messina. Um homem verdadeiramente santo. No momento discute-se sua canonização, como verdadeiro apóstolo do Brasil. Com esse religioso Francisco Miguel interagiu na qualidade de Procurador do Padroeiro São José. Esteve presente em ato notarial em que sua família doou terras para o patrimônio da Igreja. Assinou a escritura pública como procurador do Padroeiro São José.
Na escritura de doação consta que o Capuchinho muito se empenhou para realização do ato. Ora, com certeza, interagiu, com Francisco Miguel de Siqueira que era o líder da família. Com esse religioso teve uma relação construtiva. Civilizatória.
O segundo religioso com quem Francisco Miguel de Siqueira interagiu é também um capuchinho: Frei Serafim de Catânea. Também um religioso que deixou um legado de realizações não só em Pernambuco, mas também no Piauí. Com esse religioso Francisco Miguel de Siqueira construiu o cemitério para os que foram vítimas da cólera que chegou ao Brasil em 1850. Há registro documentado dos elogios que Francisco Miguel recebeu por essa obra, e também pela construção da Matriz da Ingazeira. Informações de jornais da época.
Detalhe importante. Francisco Miguel de Siqueira se relacionou bem com esses dois missionários italianos por um motivo que deve ser registrado. Os capuchinhos vinham para o Brasil no século XIX com uma missão civilizatória, dado que, foi o Estado do Brasileiro, por ato de Dom Pedro, que os fez vir ao nosso país. Não eram contestadores das leis do Império como foram os Padres Pedro de Souza Pereira e João Vasco Cabral d’Algonez.
Finalmente, não posso deixar (repetindo), de deixar claro o meu respeito pela Igreja Católica e seu divino papel civilizador. Faço coro com o que disse François-René de Chateaubriand, em seu livro “O Gênio do Cristianismo”: “A verdade tão conhecida em Roma como na Grécia, de que é com religião, e jamais com princípios abstratos de filosofia, que os homens se civilizam e os impérios se fundam…”. Negritamos.
Francisco Miguel de Siqueira se uniu a Igreja Católica para o processo civilizatório do Sertão do Pajéu! Está correto o provérbio árabe: “Os cães ladram e a caravana passa”.
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Observação Diário do Acre: Na foto de capa, vemos Frei Caetano de Messina (1807–1878), conhecido como “missionário da justiça e da paz”. Ele poderá ser reconhecido como santo pela Igreja Católica, que já deu início ao processo de beatificação e canonização.