J. R. Guzzo: ‘Nada motiva mais nossos políticos do que estatais que faturam R$ 1 trilhão’

Uma matéria do jornalista Celso Yano, publicada há pouco pela Gazeta do Povo, revela muito sobre as forças que realmente movem a vida política brasileira, hoje, ontem e sempre. Na verdade, e no fundo, os fatos ali expostos revelam possivelmente tudo o que é necessário saber para se ter uma ideia realista sobre o que é mesmo o Brasil de carne e osso — não o Brasil das “análises políticas”, das “pesquisas de intenção de voto” e de outras flores do noticiário, mas o Brasil que existe na vida como ela é. As empresas estatais brasileiras, informa a matéria, faturaram R$ 1 trilhão em 2021, último ano para o qual há um balanço completo. É mais do que 35% de aumento. Os lucros também explodiram: foram mais do que três vezes maiores. É dinheiro em qualquer lugar do mundo. Aqui, não apenas é dinheiro. É o próprio sangue da política nacional — é isso, o tempo todo, o que interessa à maioria dos que mandam no país, e que faz o universo público ser tão atraente para todos eles.

Números como esses mostram, sem dúvida, que nunca as estatais deste país foram administradas tão bem, ou com tão bons resultados, do ponto de vista financeiro. É um contraste dramático com os catorze anos de Lula e Dilma Rousseff, quando essas mesmas empresas, exatamente as mesmas, davam prejuízos apavorantes — que viravam, naturalmente, lucros sem paralelo na História para os bolsos privados dos amigos do governo, e para os amigos dos amigos. É precisamente, também, o que vai acontecer de novo, por tudo o que o ex-presidente Lula promete fazer quando voltar ao Palácio do Planalto. Mas a questão, aqui, não é essa — não é a diferença entre competência e roubalheira. É o dinheiro em si, esse 1 trilhãozinho. Não há quem resista; os políticos e as forças que os sustentam vão matar a mãe para terem acesso à mina de ouro que veem diante de si.

Não poderia haver comprovação mais clara para isso do que o artigo da Gazeta do Povo. O leitor é informado, ali, que políticos que atuam em lados opostos, da alta esquerda à alta direita, estão operando em conjunto no projeto dos sonhos de todos eles: mudar a legislação recente que profissionalizou a gestão das empresas estatais, dificulta as ingerências políticas e impede a distribuição de diretorias e empregos para os saqueadores do dinheiro público. Ninguém briga tanto para acabar com isso quanto o PT. As novas regras, obviamente, têm relação direta com os recordes de faturamento e de lucros das estatais. Mas isso só resulta em benefício para a população, que vê o dinheiro passar para o Erário público e dali, em tese, para despesas com alguma forma de bem-estar social. Mas quem é que está interessado no público? Estão interessados em ficar com o dinheiro eles mesmos, só isso — e R$ 1 trilhão é o suficiente para fazer das estatais, e do seu caixa, a força mais importante na política nacional do Brasil de hoje.

J.R. Guzzo

*J.R. Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.

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