O ex-presidente Lula acaba de anunciar mais uma realização do seu futuro governo: o Ministério do Índio. É a última promessa, na escalada que vem fazendo há algumas semanas; segundo ele, o Brasil precisa com urgência de mais esse ministério, além de todos os que já tem e os que seu governo vai criar. Como é que ninguém havia pensado nisso antes, não é? Pois então: Lula está aí, mais uma vez, para resolver o que ninguém resolve neste país. Foi muito aplaudido, é claro, quando apresentou seu novo projeto, numa reunião com lideranças indígenas profissionais — dessas que vivem viajando à Europa, com tudo pago, para falar mal do Brasil, que estão envolvidas com histórias de ONGs, e por aí afora. Basta olhar as fotos: são as mesmas caras de sempre.
Há hoje no Brasil 900 mil índios, ou algo assim, menos que a população de Guarulhos — sendo que a maioria deles vive fora das reservas indígenas oficiais. Será que precisa um ministério inteiro para cuidar de 0,4% da população brasileira? Também há no Brasil 1,2 milhão de advogados — mais que índio. Por que não criar, então, um Ministério dos Advogados? Ou um Ministério dos Dentistas? Só de motoboys, pelo Brasil afora, há uma população que chega a 1,4 milhão de trabalhadores. Fica aí a ideia para Lula: a criação do Ministério dos Motoboys. É demente. Mas esse tipo de coisa é puro Lula: há mais de 40 anos ele está convencido de que todos os problemas do Brasil se resolvem com a criação de ministérios. Há fome? Cria-se o Ministério da Fome. Falta chuva? Cria-se o Ministério da Chuva. Chove demais? Cria-se o Ministério do Bom Tempo. Os governos Lula jamais resolveram um único problema agindo desse jeito. Mas a marca registrada de Lula e do PT é justamente essa: recomendar apenas soluções já comprovadamente fracassadas para qualquer questão que lhes passe pela frente.
Numa de suas declarações mais espetaculares, tempos atrás, Lula disse que a covid era uma coisa boa: “ainda bem” que a natureza trouxe essa desgraça, afirmou ele, porque assim o Brasil ia aprender de uma vez por todas como “o Estado” é importante — e como o cidadão depende da autoridade pública para tudo nesta vida. Lula admitiu, depois, que tinha sido uma declaração “infeliz”. Mas o que disse já estava dito, com toda a clareza do mundo, e mostra exatamente o que ele tem dentro da cabeça. Em nome do seu precioso “Estado”, que tem de estar crescendo sempre — inclusive com o Ministério do Índio —, ele achou que a covid foi uma grande sorte para o Brasil. Na verdade foi um horror que matou mais de 660 mil brasileiros até agora. Mas, segundo Lula, “ainda bem” que esse horror passou por aqui.
J.R. Guzzo
*J.R. Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.
Por J.R. Guzzo, publicado no jornal Folha de S. Paulo em 13 abril de 2022