Tecnologia, qualidade de vida e políticas públicas são caminhos para evitar o esvaziamento rural e garantir a continuidade da agricultura.
A sucessão entre pais e filhos é um dos principais desafios para a continuidade da agricultura no Brasil, especialmente entre os produtores enquadrados na agricultura familiar. O tema vai muito além da transferência de bens e terras: trata-se de manter a produção de alimentos, preservar tradições e assegurar a sustentabilidade do agronegócio.
Porém, manter os jovens no campo é cada vez mais difícil. Dados da PNAD e do Censo Agropecuário apontam queda significativa da participação de pessoas com menos de 29 anos no setor agropecuário. Para o engenheiro agrônomo Otavio Valentim Balsadi, da Embrapa, a solução passa por transformar o espaço rural em um lugar de oportunidades e qualidade de vida:
“O rural precisa ser um local agradável de morar, caso contrário essas pessoas buscarão em outros locais a realização dos seus desejos e sonhos pessoais e profissionais.”
O impacto da falta de sucessores
A ausência de sucessores pode comprometer diretamente a produção de alimentos. Embora o Brasil possa compensar a queda de agricultores familiares com outros perfis de produtores, o risco é de maior concentração de terras e exclusão social.
Segundo Balsadi, a entrada de jovens qualificados é vital não apenas para a continuidade, mas também para a modernização da agricultura, ao mesclar experiência e inovação.
O desafio é global
O esvaziamento do campo não é exclusividade brasileira.
- Japão: risco de desaparecimento de 800 cidades até 2040.
- Espanha: redução de 28% da população rural em 50 anos, fenômeno chamado de “Espanha vazia”.
- Brasil: segundo o Banco Mundial, a população rural caiu 33,8% entre 2000 e 2022 — bem acima da média mundial (19,2%).
Apesar da força da agricultura familiar — que representa 90% das propriedades produtivas no Brasil e mais de 90% na União Europeia — a sucessão enfrenta dificuldades. Apenas 30% das empresas familiares brasileiras chegam à segunda geração, e 5% à terceira, índices semelhantes aos dos EUA e Europa.
Caminhos para reverter a tendência
Estudos do Ipea apontam que os principais obstáculos para a sucessão no campo envolvem:
- Falta de interesse das novas gerações, que veem mais oportunidades na cidade;
- Gestão operacional e financeira complexa das propriedades rurais;
- Conflitos familiares na divisão de patrimônio.
Para mudar esse cenário, são necessárias políticas públicas que garantam:
- Boa qualidade de vida e infraestrutura no campo;
- Participação ativa dos jovens na gestão das propriedades;
- Educação de qualidade e formação profissional;
- Apoio a programas de associativismo e cooperativismo;
- Incentivo à formação de novas lideranças rurais.
A digitalização como oportunidade
A transformação digital surge como um dos principais aliados da sucessão rural. Entre as ferramentas que já estão mudando a realidade do campo, destacam-se:
- Agricultura de precisão: sensores, drones e análise de dados para reduzir custos e aumentar produtividade;
- Conectividade: internet rápida no campo, ampliando acesso à informação e mercados;
- Automatização e robótica: tratores autônomos e irrigação inteligente;
- Softwares de gestão: que integram finanças, estoques e safras, tornando a administração mais eficiente.
Essas soluções tornam a atividade mais atrativa para os jovens, unindo tradição e inovação. Como lembra Balsadi, “o ideal é mesclar a experiência de quem já tem muitos anos de lida na agricultura com a vontade de inovar dos mais jovens, sempre dentro de um compromisso com a sustentabilidade econômica, social e ambiental”.
Conclusão
O esvaziamento do campo e os desafios da sucessão familiar não são apenas questões econômicas, mas também sociais e culturais. A continuidade do agronegócio brasileiro (e mundial) depende da capacidade de atrair e reter os jovens no meio rural.
Com planejamento, tecnologia e políticas adequadas, a sucessão pode garantir um futuro próspero para as famílias rurais e para a segurança alimentar global.