O Velódromo d’Hiver e a Perfídia do 8 e 9 de janeiro

Os atos do 8 de janeiro de 2023 culminaram numa trágica prisão em massa realizada no dia 9 pelas autoridades brasileiras. O dossiê recém-publicado sob o título “Arquivos do 8 de Janeiro: por dentro da força-tarefa judicial secreta para prisões em massa”, elaborado pelos jornalistas David Ágape e Eli Vieira e publicado por Michael Shellenberger, deixou clara a assustadora semelhança das prisões em massa do 8 de janeiro com aquelas ocorridas no velódromo ‘d’Hiver, em Paris, em 1942.

Na França, nos dias 16 e 17 de julho de 1942, cerca de 13 mil judeus franceses, estrangeiros e apátridas, foram presos em massa pela Polícia Francesa, sob ordens de autoridades alemãs, e mantidos em condições sub-humanas, enquanto eram “divididos” e deportados para os campos de concentração nos arredores de Paris. A motivação para esta prisão em massa, em Paris, era uma só: ser judeu.

No 8 de janeiro, o critério foi outro: não mais uma estrela de Davi bordada nas roupas, mas a bandeira do Brasil, as cores verde-amarela, a identificação biométrica ilegal usando o sistema do TSE, mas principalmente o acesso às redes sociais, que levaram à emissão de uma “Certidão” até então secreta, elaborada pela equipe de Alexandre de Moraes, que carimbava o destino imediato das velhinhas, crianças e cachorros, vendedores de algodão doce e até mendigos, para os campos de concentração da Papuda e da Colmeia.

Aquelas certidões apenas vieram à luz após o dossiê publicado segunda-feira, 4 de agosto de 2025; elas não constam nos autos de nenhum processo, demonstrando a ilegalidade na fabricação de provas, num conluio envolvendo autoridades do estado brasileiro contra cidadãos comuns.

Numa verdadeira “eugenia política” — termo que surgiu em meio às discussões do assunto, motivadas com a divulgação destes dados revoltantes da recém história nacional —, aquelas “Certidões Positivas” registraram os “crimes” daqueles “sub-humanos bolsonaristas” — como eram vistos pelos seus algozes —: Claudiomiro da Rosa Soares, por exemplo, consta com a seguinte acusação: “Perfil no Facebook com postagens antidemocráticas e que revelam inconformismo com os resultados das eleições de 2022”. Na “Certidão Positiva” de Adenilson Demetrio de Cordova, consta: “Perfil pessoal no Twitter com postagens antigas pedindo adesão a um manifesto contra decisões proferidas pelo Judiciário no combate às fake news, subscrito pelo Movimento Advogados de Direita Brasil”.

Mas se você pensa que a inconformidade com as eleições de 2022 foi a desculpa que motivou estes procedimentos criminosos perpetrados contra cidadãos comuns, você está enganado. A tirania, uma vez manifestada, não encontra limites; a tirania não é comedida nem se autorregula; ela apenas avançará, a menos que seja impedida de continuar sua marcha fúnebre, pisoteando tanto cadáveres quantos estejam pelo menio do caminho. Isto fica claro quando lemos a “Certidão Positiva” de Ademir Domingos Pinto da Silva, com a seguinte acusação: “Perfil pessoal no Twitter com postagens antigas que exprimem aversão a Lula e ao Partido dos Trabalhadores” — a publicação em questão foi feita no dia 10 de julho de 2018, quase cinco anos antes dos eventos do 8 de janeiro.

Tornados “sub-cidadãos, “a-pessoas” ou outro qualquer termo orwelliano que você opte por empregar, estes brasileiros do 8 de janeiro foram usados como modelo, verdadeiros exemplos em praça pública. Eles servem ao stablishment na sua demonstração de força, da capacidade que as instituições têm de não somente atrasar a sua vida, traumatizá-lo profundamente, mas até mesmo, matá-lo, como ocorreu com Cleriston Pereira da Cunha (Clezão), Éder Pereira Jacinto, Kleber de Freitas, Antônio Marques da Silva, Giovanni Carlos dos Santos e Jony Figueiredo da Silva, os mortos da ditadura judicial brasileira.

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