O Brasil registra baixo crescimento desde a década de 1980, ao comparar com outros países emergentes.
De lá para cá, o país conseguiu os chamados “voos de galinha”, alguns anos de bonança mas que logo eram sucedidos por nova desaceleração. Para explicar a trajetória da economia brasileira nas últimas 4 décadas, a CNN consultou especialistas para buscar responder à seguinte questão: por que o Brasil não consegue manter crescimento sustentável de longo prazo?
Desde 2000, o Brasil tem uma média de crescimento de 2,4%. O percentual é bem abaixo do registrado por países como China (8,2%) e Índia (6,3%) no período, mas também menor do que o PIB (Produto Interno Bruto) médio de vizinhos como Chile (3,4%), Colômbia (3,6%) e Peru (4,1%) – economias historicamente menos desenvolvidas que a brasileira.
Os dados mostram que o crescimento brasileiro fica no mesmo patamar da média dos países da América Latina e Caribe.
Sejam causas ou consequências, diversos fatores compõem a fórmula que inibe o salto do PIB brasileiro, como atraso educacional, falta de poupança, declínio da produtividade, estrangulamento do orçamento, desequilíbrio fiscal, falta de investimento em educação e tecnologia, mau uso das contas públicas, entre outros.
Ainda que a maior parte dos economistas defenda não haver bala de prata para o problema, há consonância em diagnosticar que o país precisa de mudanças estruturais profundas para impulsionar a economia de forma sólida. Uma das mudanças passa pelo equilíbrio fiscal, segundo eles.
“O problema do Brasil é que as crises fiscais são recorrentes. Como você reduz isso?”, questionou Sílvia Mattos, economista do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
As consequências dos gastos excessivos do governo
O país enfrenta até hoje as consequências de gastos excessivos e do endividamento crescente das últimas quatro décadas, o que inibiu o potencial do PIB. Costurados a grosso modo ora ou outra, o desequilíbrio fiscal segue um problema.
“O próprio governo não tem condições de deixar de gastar algumas questões que estão previstas. Como se pode enfrentar isso? Fazendo reformas, seja administrativa, tributária, da previdência, tudo isso precisa ser feito para segurar esse processo, além de mudanças constitucionais para diminuir estes gastos obrigatórios”, descreveu Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda.
O endividamento e os gastos excessivos levaram a uma poupança interna tímida, justamente uma das principais fontes de investimento produtivo para fazer o país crescer. Assim, o descontrole fiscal e a falta de produtividade ocasionam outro fator que acompanha o país há décadas: taxas de juros extremamente elevadas.
“O Brasil tem um problema fiscal grave e que a gente não consegue enfrentar. Nos poucos momentos que a gente enfrentou a questão fiscal, as taxas de juros caíram”, pontuou Marcos Lisboa, ex-presidente do Insper e ex-secretário do Ministério da Fazenda.
“A gente tem um governo que gasta muito mais do que a maior parte dos países emergentes similares aos nossos e isso contribui para um perfil de baixa poupança, portanto, baixo investimento e capacidade de crescimento mais lenta a que dos outros”, acrescentou Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor do BC.
Mas desde quando enfrentamos esse problema? Para responder a essa pergunta, é preciso voltar na história e destrinchar os caminhos econômicos que o país trilhou.
Industrialização e as origens da “herança maldita”
O Brasil passou por um período de industrialização entre 1930 a 1980. Nas duas primeiras décadas do período, foi adotada a estratégia de utilizar um processo de substituição de importação, o que proporcionou o desenvolvimento da indústria.
Depois, durante o governo de Juscelino Kubitschek, houve a implementação do Plano de Metas, que completou o parque industrial brasileiro, com foco na indústria de bens de capital, e proporcionou um “boom” da economia.
Em contrapartida, de 1962 a 1967 houve um efeito inflacionário que resultou na desaceleração da economia, mas o período foi sucedido pelo “milagre econômico”, que levou o Brasil a crescer acima de 10% ao ano, enquanto o resto do mundo atravessa um período de turbulência e crescimento abaixo.
A estagnação do crescimento do Brasil tem início após o milagre econômico, da época da ditadura militar, entre 1963 e 1973, impulsionado por gastos que futuramente levaram ao endividamento do país. Vale ressaltar que não há precisão no quadro fiscal do país devido aos dados da época.
“Nós tivemos uma herança, que a gente pode chamar de ‘maldita’ vinda dos anos 1970. A forma como o Brasil procurou crescer foi baseada no endividamento muito forçado, num período muito difícil para o mundo, com muitos choques internacionais, o petróleo e juros americanos”, explicou o coordenador do curso de pós-graduação em economia da FGV e ex-secretário-executivo da Fazenda, Márcio Holland.
“E entramos nos anos 1980 com o nível de endividamento externo muito grande e a pressão inflacionária muito alta. Foi uma década perdida, que tem nos levado à luta contra um quadro de quase hiperinflação, endividamento externo, então o país não vai crescer”, complementou.
Os especialistas ponderam que, entre diversos outros fatores, não houve investimentos na atualização da indústria que permitissem o surgimento do desenvolvimento nas novas tecnologia e mão de obra qualificada para as “profissões do futuro”.
“No Brasil, os lobbies convenceram o debate público que indústria é a fábrica de montagem. É montar carro, geladeira, televisão. Indústria não é computação, IA, nem inovar em outros setores. E isso levou ao nosso atraso. Países que cresceram optaram por novas tecnologias, pela inovação, pelo investimento em mão de obra qualificada e não pela velha montagem, com baixo valor adicionado”, destacou Lisboa.
Exemplos de países que cresceram com investimento pesado na industrialização para o desenvolvimento de polos tecnológicos incluem Coreia do Sul, Taiwan, Singapura e, claro, a China.