O debate sobre a possível proibição da exportação de gado vivo no Brasil voltou ao centro das discussões políticas e econômicas. A medida, defendida por alguns setores com o argumento de que o país deveria priorizar o abate interno e a exportação de carne com maior valor agregado, levanta preocupações entre especialistas do setor pecuário. Estudos mostram que a interrupção desse comércio poderia gerar perdas econômicas significativas, afetando desde a cria até a engorda, além de impactar empregos, renda e competitividade no mercado internacional.
De acordo com análise da Scot Consultoria, a exportação de bovinos vivos não concorre diretamente com a carne in natura, pois atende mercados específicos que preferem o animal vivo por razões religiosas, culturais ou operacionais.
“Reposição e carne são mercados distintos”, explica a consultoria. Segundo o estudo, impedir o embarque de animais vivos reduziria canais de escoamento importantes da produção, especialmente da fase de cria, desestimulando o investimento e a reposição no campo.
Exportação de gado vivo segue aquecida e revela demanda consistente
Em um dos meses mais recentes analisados, o Brasil exportou 138,3 mil cabeças de bovinos, o maior volume do ano e um dos maiores da série histórica. Países como Marrocos, Iraque e Egito figuram entre os principais compradores do rebanho brasileiro, com destaque para nações de maioria islâmica, onde a tradição de abate conforme preceitos religiosos exige a presença do animal vivo.
Convertendo esse volume para carne, o equivalente seria cerca de 6,7% do total exportado de carne bovina in natura no mesmo período. Porém, para além da carne, existe o mercado de bovinos de reposição — animais mais leves que serão terminados nos países importadores. Só no ano analisado, 205,2 mil cabeças de reposição foram embarcadas, representando quase 20% da receita com exportação de gado vivo.
Países pagam prêmio para importar o animal vivo
Outro ponto crucial está no valor pago pelos compradores internacionais. De acordo com a comparação feita pela Scot Consultoria, o gado vivo recebe, em média, 28,7% a mais por tonelada quando comparado à carne bovina in natura. Em alguns países, esse prêmio supera 40%, como no Marrocos, Iraque e Argélia.
Ou seja, substituir a exportação de gado vivo por carne embalaria uma perda direta de receita. Em estimativa apresentada pela consultoria, o país deixaria de arrecadar cerca de US$ 90 milhões se todo o volume exportado vivo fosse convertido em carne.
“Quando esses países não adquirem a carne brasileira, não é por falta de capacidade nossa, mas porque preferem o produto na forma viva”, destaca a análise.
Bem-estar animal é parte do debate — mas a solução pode não ser o banimento
A discussão também envolve preocupações em relação ao bem-estar dos animais durante o transporte marítimo, onde há risco de estresse e mortalidade. Entretanto, especialistas lembram que mais de 99% das operações ocorrem dentro dos padrões sanitários e sem incidentes significativos, quando bem conduzidas.
Para a Scot Consultoria, a solução não está no banimento, mas em “salvaguardas rigorosas”, como auditorias independentes, punições para irregularidades, metas de bem-estar e monitoramento operacional.
“O dilema da política pública não é simples: ao proibir totalmente a prática, pode-se mitigar danos ao animal, mas isso vem com o custo de empregos, renda e investimentos em toda a cadeia”, aponta a consultoria.
O que está em jogo
| Impactos da proibição | Consequências esperadas |
|---|---|
| Redução de receita | Perda do prêmio pago pelo gado vivo |
| Queda no investimento em cria | Menor incentivo à produção de bezerros |
| Deslocamento de mercados | Países buscariam fornecedores concorrentes |
| Fechamento de postos de trabalho | Da fazenda ao embarque portuário |
A proposta de banir a exportação de gado vivo tem efeitos que vão além da pauta do bem-estar animal. Ao desconsiderar que existe uma demanda internacional consolidada para o animal vivo, o Brasil correria o risco de:
- Perder mercados estratégicos
- Reduzir a renda de produtores
- Comprometer a cadeia da cria e reposição
- Diminuir sua competitividade global
O caminho mais viável, segundo especialistas, é conciliar bem-estar animal com manutenção da atividade, reforçando fiscalização e padrões logísticos, e não extinguindo um mercado que hoje é lucrativo, relevante e funcional dentro da estrutura pecuária brasileira.






