Nos últimos dias, o mercado financeiro foi surpreendido com a liquidação extrajudicial do Banco Master determinada pelo Banco Central. Para muitos, foi apenas mais uma notícia no setor bancário. Mas, para quem vive do campo ou depende de instituições financeiras para custear produção, investir, renegociar dívidas ou financiar safra, esse episódio acende um alerta importante: nem banco é intocável e absoluto.
Existe uma percepção enraizada no Brasil, especialmente entre produtores rurais, de que o banco é uma espécie de “autoridade absoluta”. Uma instituição que dita regras, estabelece taxas, impõe prazos e determina condições que parecem inquestionáveis. E é justamente aqui que a liquidação do Banco Master revela algo essencial: até os gigantes erram.
O que a queda de um banco mostra sobre o sistema financeiro?
A liquidação extrajudicial é uma medida extrema, tomada quando uma instituição financeira não consegue mais cumprir suas obrigações de forma segura. Isso significa que falhas ocorreram, falhas de gestão, de risco, de governança, de operação e principalmente na segurança permitindo que ocorram fraudes (prática comum dentro da maioria das instituições).
E tudo isso têm consequências, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), responsável por cobrir perdas de depositantes em caso de quebra de instituições financeiras vai cobrir uma fatia pequena com limite de até 250 mil para cada investidor, porém, o desembolso total será o maior dos últimos 30 anos, bilhões.
E isso obviamente influenciará o sistema financeiro que atualmente encontra-se em colapso junto ao setor mais importante do país, o agronegócio.
Quando um banco desse porte é liquidado, fica claro que:
- Bancos não são infalíveis.
- Bancos também estão sujeitos às regras.
- Bancos erram, e muito.
- Bancos podem ser contestados – inclusive juridicamente.
E isso muda a perspectiva de quem negocia diariamente com tais instituições.
A relação do produtor rural com o banco: poder desequilibrado
Quem vive no campo conhece bem o peso que um financiamento mal estruturado pode ter na safra, no fluxo de caixa, nos custos operacionais e até na sobrevivência da propriedade. Por isso, ao sentar para assinar um contrato, muitos produtores acabam aceitando:
- taxas que não compreendem totalmente;
- cláusulas excessivamente duras;
- prazos que não conversam com o ciclo produtivo;
- negativas de prorrogação ou renegociação como se fossem mandamentos absolutos e inquestionáveis.
Para o produtor rural, a lógica costuma ser:
“O banco falou, a água parou, então é assim.”
Mas o episódio recente mostra que a verdade é outra: o banco não é um ente acima de tudo e de todos. Ele é uma empresa privada, obrigada a seguir normas, passível de controle, investigação e responsabilização. Assim como muitos setores no país são falhos na fiscalização, não é diferente com os bancos, o que permite arrombo como este.
Se até um banco de grande porte pode ser liquidado, por que o produtor deveria se submeter a tudo sem questionar?
O que o produtor precisa entender (e aplicar) daqui pra frente
Negociar com banco é, acima de tudo, entender o jogo.
E quem não entende o jogo, é engolido por ele. Eu sempre falo: quem sabe mais, paga menos. Simples.
A partir desse episódio, alguns pontos precisam ser reforçados:
1. Contrato bancário não é absoluto. É negociável.
Cláusulas podem ser revistas, renegociadas e adequadas ao ciclo agrícola. Nada é “porque tem que ser”.
2. Taxas e condições precisam ser compreendidas.
Não existe taxa “padrão” ou “imposta”. Existe taxa negociada e o produtor tem poder para isso.
3. A negativa de prorrogação não é o fim da conversa.
Existem instrumentos legais, técnicas de negociação e precedentes que permitem reequilibrar contratos em momentos críticos.
4. Conhecimento jurídico é ferramenta de proteção.
Acesso à informação e suporte especializado evitam que o produtor seja colocado contra a parede.
5. Transparência é obrigação do banco, não favor.
E quando ela não ocorre, há meios legais de contestação.

Por que tudo isso importa para quem vive do agro?
Porque o produtor é um dos pilares da economia nacional. E quando esse pilar está vulnerável, seja por desconhecimento jurídico, por pressões bancárias ou por contratos desequilibrados, toda a cadeia sente.
Negociações bancárias mais transparentes, conscientes e juridicamente embasadas não beneficiam apenas o produtor. Elas fortalecem toda a estrutura que depende de uma produção estável, planejada e sustentável.
A lição é clara: se até os gigantes caem, você não precisa aceitar tudo de cabeça baixa.
Informação, estratégia e apoio jurídico podem mudar completamente o desfecho de uma negociação.
E para o produtor rural, isso significa algo simples: é hora de assumir o protagonismo na mesa do banco. Quem sabe mais, paga menos!
Sâmara Recaldes – Advogada especializada em Direito de Processo Civil, MBA em Agronegócio. Sócia fundadora do escritório Recaldes Advocacia. Membro da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS.


