Rios brasileiros podem ser ‘Mississipis’ do agro, dizem especialistas 

Investimentos em hidrovias e integração de modais poderiam reduzir custos logísticos e aumentar a competitividade do setor.

Há anos, representantes do agronegócio brasileiro alertam para os gargalos em infraestrutura e armazenagem que não acompanharam o aumento da produtividade, elevando custos e comprometendo a competitividade do setor. 

Apesar de grande parte do escoamento depender do transporte rodoviário, o país possui rios navegáveis que poderiam funcionar como verdadeiros ‘Mississipis’ – principal via de transporte agrícola nos Estados Unidos –, capazes de reduzir significativamente os custos logísticos e ampliar a eficiência do agronegócio.

A assessora técnica de logística e infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Elisangela Pereira Lopes, lembra que quando o escoamento da produção depende exclusivamente do caminhão, o custo sobe exponencialmente. “Vejam, a soja saindo de Santos até a China custa US$ 126 por tonelada. Quando há uma mescla de outros modais de transporte, como caminhões mais ferrovia, esse custo diminui um pouquinho, cai para US$ 120 por tonelada”, exemplificou. “Mas, quando você mescla a hidrovia, com a ferrovia e o modal rodoviário, esse custo cai ainda mais, para US$ 108 dólares”, complementou Lopes, ao citar dados da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais, durante a 6ª Datagro abertura de safra de soja, milho e algodão.

Ela compara ainda com os Estados Unidos, onde o uso intenso de hidrovias, à exemplo do Rio Mississippi, reduz o custo de transporte em quase metade: a mesma soja, saindo de Illinois, com o transporte hidroviário, chega na China a um custo de US$ 67 por tonelada. “O Brasil tem rios navegáveis, mas ainda não exploramos seu potencial. Se investirmos, poderemos reduzir custos e aumentar a competitividade do agronegócio”, reforçou. 

Entre esses trechos potenciais, a especialista destaca os rios Tocantins, Tietê-Paraná, Tapajós e Madeira. “Eles poderiam ser utilizados de forma intensa, mas a falta de investimento em dragagem e derrocamento impede”, pontua. 

Para Thomé Luiz Guth, superintendente de Logística Operacional da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), os gargalos logísticos geram um impacto financeiro direto. “Para você ter uma ideia, só a diferença de movimentação de uma carga de milho, de Sorriso (MT) para Santos (SP), levando por Miritituba (PA), que você diminui uns mil quilômetros, mais ou menos, tem uma diferença de R$ 100 por tonelada de carga transportada”, afirma. Ele enfatiza que, num país em que o superávit da balança comercial depende do agronegócio, a logística merece atenção estratégica.

Armazenagem

Além da infraestrutura, o setor ainda encara déficit em armazenagem. Guth detalha que a capacidade de armazenagem em grandes estados produtores, como Mato Grosso e  Goiás, caiu de 92% frente a produção em 2010 para apenas 47% atualmente. “Mesmo em estados com alguma capacidade de sobra, como parte do Paraná e do Sul, a infraestrutura muitas vezes não atende às necessidades”, explica.

Nesse aspecto, Thomé destaca que a solução vai além do crédito para construção de armazéns no nível da fazenda. Na visão dele é necessário:

Crédito facilitado para prestadores de serviço, permitindo que empresas especializadas, como cerealistas, ofereçam armazenagem aos produtores;
Modernização de armazéns existentes, especialmente em regiões com capacidade ociosa, mas infraestrutura obsoleta;
Expansão de armazéns em regiões deficitárias, como o oeste da Bahia, Piauí e Pará;
Capacitação profissional e treinamento de produtores, incluindo manejo, cálculo de custos de armazenagem e uso de ferramentas de mercado, como contratos futuros e opções;
Pesquisa e desenvolvimento em estruturas inovadoras, como silos de construção rápida;
Diversificação de modalidades de financiamento, incluindo instrumentos como os Fiagros;
Rastreabilidade e adequação para pequenos e médios produtores, garantindo acesso para diferentes portes de produção.
“São ações que o governo tem que trabalhar de forma conjunta com a iniciativa privada. Ela não é uma ação única simplesmente de crédito”, salientou.

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