Valterlucio Campelo: Quem perde com a polarização?

Sempre que vejo o discurso tendente à neutralidade política, normalmente veiculado por pacifistas de ocasião, que criticam a polarização como se ela fosse causa de eventos nefastos e não resultado do processo político, me ponho na tarefa politicamente incorreta de compreender os benefícios que ela traz ao debate público.

Em primeiro lugar, é necessário pontuar que no caso brasileiro, grande parte da chamada polarização tem duas causas flagrantes: o “nós contra eles” inaugurado e levado às últimas consequências pelo lulopetismo, e o “lawfare” praticado pelo nosso sistema judiciário contra o governo Bolsonaro, partidos e políticos associados à direita.

No primeiro caso, o discurso carregado de falsos simbolismos e eficientemente comunicado através da imprensa associada, produziu uma fratura entre os brasileiros que é ao mesmo tempo moral e ideológica. De um lado, tem-se toda a agenda woke explicitamente propagandeada e executada de modo forçado, por instituições como a universidade, a imprensa, o entretenimento e a produção cultural. De outro, a demonização de valores conservadores encurrala uma parte da população em um locus repetidamente taxado de extrema-direita. A avalanche de informações progressistas tanto produz adesões como refrações, consolidando um ambiente cada vez mais polarizado.

No segundo caso, tem-se o “lawfare”, ou seja, a instrumentalização do sistema judicial para fins políticos. Em uma sociedade democrática, onde a separação de poderes e o respeito às instituições são fundamentais, o uso abusivo dos tribunais para perseguir adversários representa um perigo iminente. O lawfare corrói princípios democráticos, compromete o Estado de Direito e mina a confiança da população nas instituições, resultando em um ambiente de instabilidade e polarização, e foi utilizado à larga contra Bolsonaro, como se pode verificar nos mais de 600 processos movidos contra o seu governo, em uma perseguição que persiste até os dias de hoje.

Mesmo que traga um inquietante clima de confronto que impede ou dificulta certos avanços, projetos e políticas governamentais, a polarização tem algumas características bastante benéficas, uma delas é a transparência ideológica.

Em sistemas com grande número de partidos, onde o discurso político é frequentemente diluído em propostas amplas e pouco definidas, a polarização ajuda a revelar posicionamentos ideológicos que antes estavam ocultos. Isso permite que os eleitores compreendam melhor as reais intenções e convicções dos atores políticos, diferenciando-os mais nitidamente.

Além disso, essa clareza facilita o debate democrático. Quando há uma polarização bem estruturada, os cidadãos podem escolher seus representantes com base em propostas e convicções mais explícitas, em vez de se guiarem por discursos vagos que tentam agradar a todos. Isso pode levar a uma maior coerência no funcionamento do sistema político, evitando surpresas após as eleições e reforçando a responsabilidade dos candidatos perante seu eleitorado.

Por outro lado, muitas siglas e grupos políticos adotam uma postura centrista não por convicção, mas por conveniência eleitoral. A polarização pode funcionar como um filtro que obriga esses grupos a tomarem posições mais claras, revelando alinhamentos que, em um cenário de baixa polarização, ficariam disfarçados por discursos genéricos. Dessa forma, evita-se que políticos mudem de lado conforme as circunstâncias, já que o debate público mais acirrado exige posicionamentos mais firmes.

No fundo, quem mais sofre e reclama da polarização são os políticos dados ao centrismo de conveniência, aqueles que tanto podem estar de um lado como de outro ou muito pelo contrário, bastando para isso se manter naquela posição que no Brasil foi apelidada de “centrão”, que abriga o clientelismo sustentado por concessões de cargos e fatias do orçamento. Quanto mais polarizado for o cenário político, menos espaço haverá para que eles mantenham seu discurso ensaboado, meio mole meio duro, às vezes até com aquela pose do tipo “não briguem”, mas que apenas disfarça seu carreirismo invertebrado.

Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS e, eventualmente, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no DIÁRIO DO ACRE, no ACRENEWS, no VOZ DA AMAZÔNIA e em outros sites. 

Tópicos:

Nossa responsabilidade é muito grande! Cabe-nos concretizar os objetivos para os quais foi criado o jornal Diário do acre