Repercutiu fortemente na mídia local, a matéria do jornalista Marcelo Toledo, publicada no jornal “Folha de São Paulo” sobre a viabilidade da cultura cafeeira no Acre, tendo como referência duas experiências, sendo uma dentro da reserva Chico Mendes, e outra no município de Acrelândia, onde uma família de produtores alcançou êxito em um concurso realizado por uma grande indústria do setor. Lembremos que este decorreu de outro, estadual, promovido ainda em 2023 pelo governo. De fato, apenas isso seria motivo de celebração, afinal, só costumamos aparecer na mídia nacional quando falam em NÃO PODE.
É necessário, contudo, antes que algum esperto (eles sempre aparecem) reivindique o mérito pela recente expansão da cafeicultura no Acre, deixar patente que este é, rigorosamente, o resultado de uma mudança de foco e de um processo bem estruturado e gerido, no sentido da promoção de alternativas de produção agrícola levado a efeito desde 2019 pelo governo Gladson Cameli e, neste momento, pela equipe liderada pelo Secretário Luis Tchê.
É claro que o café não surgiu agora no Estado. A bem da verdade, os primeiros plantios remontam ao século XIX, quando migrantes trouxeram em suas bagagens as primeiras sementes. Foi na região do Juruá que se deram os primeiros plantios. De lá para cá, entretanto, a cultura sofreu vários altos e baixos e, mesmo com esforços e políticas intermitentes e inserções variadas no mercado, somente nos últimos anos a cultura se apresenta efetivamente como uma real promessa, levando muitos agricultores a considerarem o café como opção principal de suas atividades.
A rigor, nem se trata ainda de grande ampliação da área colhida. Segundo dados do IBGE, ela se mantém praticamente constante entre os anos de 2018 e 2023 (entre 1.000 a 1.200 hectares). O que chama a atenção é o aumento da produtividade média, que no mesmo período passou de 1.718 a 2.878 quilogramas por hectare. Um incremento de 39%. Se considerarmos a safra de 2011, o incremento na produtividade é de 100%.
A produtividade da área é o dado principal porque atesta a viabilidade edafoclimática regional e, por outro lado, demonstra que ao receber os estímulos corretos em termos de tecnologia, variedade, clones, fertilizantes, irrigação etc., a cultura cafeeira pode gerar altos rendimentos financeiros, ainda mais se considerarmos a atual relação de preços.
Podemos ser então grandes produtores de café? Em termos. Rondônia, aqui vizinho, colhe 70 vezes mais que o Acre, aí fica difícil, mas o Mato Grosso colhe apenas 3 vezes mais. Quem sabe, em alguns anos podemos rivalizar com o 9º colocado entre os principais estados produtores. Há que se caminhar com cuidado e balizados por critérios técnicos rígidos a partir da análise de solos e da capacidade e vocação dos produtores a serem estimulados e, em alguns casos, fomentados diretamente pelo Estado. Diferentemente de outras tentativas relacionadas a outros produtos, não se pode apresentar no campo, como um Silvio Santos da floresta “quem quer plantar café?”. Não é assim que funciona, aliás, não funcionou, como bem sabem os que lidam com programas governamentais no Acre.
Desde que a questão central é tecnologia, chegamos a um X do problema (há outras variáveis). O Acre dispõe de condições efetivas para dar assistência técnica aos inúmeros produtores que a cada ano estarão dispostos a plantar café? Até aqui, reconheçamos, os resultados dependeram, e muito, da equipe técnica da SEAGRI, de seus dirigentes que apostaram, foram a campo, ao mercado, aos órgãos de promoção do café, fizeram treinamentos, concursos e, de certo modo, revelaram ao país, o café do Acre e suas especificidades. Entretanto, podemos afirmar, apesar de competente e dedicada, ela é pequena, insuficiente para a demanda que provavelmente se apresentará. Com a palavra, o Governo.
Um dado interessante, derivado dessa análise, é dizer, como vimos afirmando há anos, que aquela conversinha mole de “vocação florestal” do Acre só serviu para alimentar projetos políticos. A vocação do Acre é múltipla, diversa, tanto cabe pecuária, quanto extrativismo, agricultura em escala, cultivos anuais e perenes, tubérculos, leguminosas, gramíneas, frutícolas… tudo a depender do mercado, do aporte tecnológico e da seriedade com que sejam adotadas as políticas no setor. Ressaltando que a área já desflorestada em situação de degradação ou abandono, seria suficiente para multiplicar a área plantada e, definitivamente, colocar o Acre entre os grandes produtores agrícolas do país.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS, terças, quintas e sábados no DIÁRIO DO ACRE, quartas, sextas e domingos no ACRENEWS e, eventualmente, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no VOZ DA AMAZÔNIA e em outros sites.