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Valterlucio Campelo: Ulysses (não o Guimarães) espera a madrugada

Em sinal de desespero, uma banda da coligação que tem o petemedebista Marcus Alexandre como cabeça de chapa, está investindo numa improvável candidatura do ex-prefeito, ex-governador, ex-senador e ex-deputado federal Flaviano Melo à vice-prefeito. Uma composição de chapa falsamente pura (MDB+MDB), que na verdade apenas revela a verdadeira face, ou seja, é uma chapa PT-MDB que precisa se afirmar.

Sem que Flaviano Melo tenha dado nenhum sinal de aceitação, o balão surgiu como que emparedando o velho político que foi, sem dúvidas, o melhor prefeito e o melhor governador de Rio Branco e do Acre, respectivamente, nos últimos 40 anos. Emparedando porque, se ele aceita, a discussão se encerra, ninguém se atreveria a questioná-lo e haveria uma pacificação pelo menos aparente nas hostes lulopetistas que sustentam a candidatura do Marcus Alexandre. Na verdade, reconheçamos, é uma tática inteligente, já que até aqui não apareceu alguém que seja ao mesmo tempo não-alinhado ideológico com a esquerda e possuidor de respeitável cabedal político.

A maldade é com o próprio Flaviano que entrou na política justamente pelas portas da prefeitura, sendo de lá foi catapultado para os patamares mais altos da política acreana. Não se faz isso com alguém que tenha a história do Flaviano Melo. Se quisesse manter-se num mandato político, seria ele próprio o candidato com a possibilidade de encerrar a carreira pela porta por onde entrou, não um coadjuvante.

Tratar o Flaviano como um cabo eleitoral de luxo é um desrespeito que afronta até seus eleitores, ex-eleitores e admiradores entre os quais me incluo e que são muitos. Tudo bem que na posição em que se encontra, com a responsabilidade que lhe incumbe a história, Flaviano Melo participe da aliança MDB-PT, fato que repercute a aliança nacional (não de hoje). Pode-se aceitar que, cansado de enfrentar o PT no Acre, perdendo mais do que ganhando, mesmo sendo afrontado, insultado, acusado injustamente, humilhado durante décadas em praça pública, ele perdoe os seus algozes e, na tentativa de reacender a sigla baqueada, empreste-a momentaneamente ao invasor, afinal “Há mais coisas na política do que pode imaginar nossa filosofia”, diria Horácio, o personagem de Shakespeare em Hamlet. Entretanto, submeter-se ele próprio a uma candidatura que pode ser funesta e se aposentar derrotado para vice-prefeito, é um pouco demais, não cabe em sua biografia, não honra a história que será contada futuramente.

Flaviano Melo certamente sabe disso e, pelo que se conhece até aqui, não autorizou essa especulação. Se quisesse, apenas diria “aceito” e pronto, não haveria contestação. Desconfio que se trata mesmo de tentativa desesperada de quem, não traduzindo uma vontade verdadeiramente honesta e espontânea do eleitor, precisa dourar a pílula da contradição e sancionar o empréstimo da sigla ao PT, que se prepara para instalar-se sobre os escombros do edifício político que ele mesmo demoliu.

O eleitor do MDB, em média mais velho e “escolado”, continua desconfiado desse casamento esdrúxulo entre acusador e acusado, entre algoz e vítima, tudo em torno de um renascimento fantasioso posto que encarnado por um falso representante do MDB. O acolhimento do Petista, negociado nas sombras, precisa ser explicado a cada eleitor que, muito mais facilmente, percebe por si mesmo a incongruência e a “incompatibilidade genética” desse cruzamento, pelo menos no nível do chão da praça, já que nas cúpulas tudo é possível.

Outra não é, aliás, a grande dificuldade do petemedebista no processo eleitoral que se avizinha – “como se fazer passar por emedebista, sendo escarrado e cuspido petista de carteirinha”? A presença de Flaviano Melo na chapa poderia ajudar a enfiar essa historinha nas mentes mais crédulas, mas também poderá levá-lo ao descrédito. Acontece que nesta capital de 400.000 habitantes circulam 24 deputados estaduais, 8 deputados federais, 3 senadores, 19 vereadores, prefeito, governador e todo o estamento executivo, o judiciário… quer dizer, o acreano respira política porque ela está um dedo abaixo de nossos narizes queiramos ou não, então o eleitor percebe a trama que lhe está sendo apresentada a partir de negociações das quais não participou.

Desde que o Império Romano invadiu a Bretanha (43DC) e nomeou Carataco seu Rei fantoche, a tática de o invasor promover o invadido a aliado subalterno é utilizada seguidamente. Em primeiro, para apaziguar os ânimos dos revoltosos ou insatisfeitos, em segundo, para humilhar a gente dominada. Por falar em história, cá do lado de fora é fácil reconhecer a face do cavaleiro que apeou do cavalo branco para assumir o lugar de Ulysses.

Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS e, eventualmente, no seu BLOG, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no DIÁRIO DO ACRE, no ACRENEWS e em outros sites. Quem desejar adquirir seu livro de contos mais recente “Pronto, Contei!”, pode fazê-lo através do e-mail valbcampelo@gmail.com

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