A Farsul (Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul) promoveu, na semana passada, uma incrível reunião. Colocou cerca de 500 jovens junto com 70 antigos presidentes de sindicatos rurais. Misturou a experiência com o idealismo.
Em um mesmo salão, durante 1 dia e meio se desenvolveram variadas atividades de aprendizado técnico, conscientização política, comunicação e cooperação. O mote do evento era a defesa do agro.
Todos nós, ligados ao campo, andamos muito incomodados com seguidas agressões vindas de gente famosa contra a nossa agricultura. Seja na questão dos agrotóxicos e no desmatamento, seja na criação de animais e no consumo de carnes, volta e meia algum artista tasca uma baboseira que ganha notoriedade nas redes sociais.
Depreciam o valor da agricultura nacional. Funciona como se anos de trabalho sério e muito suor e dedicação dos produtores rurais fossem jogados fora, desprezados pela sociedade urbana. Um tapa na cara da moderna ciência agrária.
Com esse espírito, entre irritados e desafiados, aquela plateia em Gramado (RS) ouviu atenta a apresentação da jovem zootecnista Rafaela Cotrim, autora de um surpreendente livro intitulado “Pecuária, a verdade por trás das histórias que lhe contaram”. Defensora das recentes regras do bem-estar animal e promotora do abate humanitário, Rafaela exortou o pessoal a reagir, dizendo que a pecuária tecnológica não tem o que esconder.
Esse é o ponto. Antigamente as atividades rurais eram primárias e predatórias. Hoje surgiram novos conceitos e práticas sustentáveis. Mas, claro, estamos numa transição. Há ainda, na rabeira, quem continue fazendo tudo errado. E existem, na ponta, os produtores que comandam a transformação no campo.
Gerenciamento de conflitos e comunicação não-violenta foi o tema desenvolvido por Wesley Ribeiro, especialista em cultura e inovação do Sebrae-RS. O brilhante professor mexeu com a galera quando sugeriu convidar a cantora Anitta para o próximo evento da Farsul Jovem.
Ao perguntar, naquele imenso auditório, quem concordava com sua inusitada proposta, percebia-se que ninguém sabia ao certo se levantava a mão ou permanecia quieto. Afinal, como tratar aqueles artistas que rebaixam a imagem do agro?
Modestamente, minha colaboração no encontro recaiu sobre a importância do conhecimento científico e da boa informação técnica na compreensão da realidade rural. Para enfrentar os mitos e apresentar os fatos.
Fácil de falar, mas difícil de funcionar. Ocorre que por trás das imprecações contra as virtudes do agro, se escondem preconceitos, ideologias e interesses mercadológicos. Por isso, nem sempre a correta informação resolve o problema da comunicação.
De onde vêm os mitos? É o que todos querem saber. …
Começam pela escola. Desgraçadamente os livros didáticos das instituições de ensino brasileiras estão eivados de velhacarias trazidas do passado escravagista e latifundiário de nossa agricultura, sem nenhuma conexão com a realidade atual.
Nos bancos escolares se alimentam os mitos contra a moderna agropecuária brasileira. Depois, eles se contaminam pelo jogo da política, ou se recheiam pelas causas naturalistas, próprias da elite da sociedade. Intelectuais adoram esse movimento regressivo da esquerda caviar.
Simplesmente contar a nossa história, falando a verdade. É o que tenho defendido nessas plateias pelo país afora. O agro moderno e tecnológico precisa ser mostrado por aqueles que o praticam, utilizando a linguagem das redes sociais.
Por exemplo, quando subir no trator para pulverizar inseticida contra uma praga, mostrar como se utiliza a tecnologia correta de controle fitossanitário.
Se faz a proteção da mata ciliar da propriedade, gravar um vídeo para indicar a recuperação da biodiversidade local. Se trata o gado sem sofrimento no curral, criar uma mensagem para explicar o respeito animal.
Há uma dificuldade. E aqui reside a força do inédito encontro promovido pela Farsul em Gramado: quem sabe conversar na rede são os jovens agricultores e não a velha guarda ruralista. Sem qualquer demérito, tem a ver com geração.
Conclusão: só a renovação dos líderes rurais será capaz de estabelecer uma nova conexão do agro com os formadores de opinião citadinos. No mínimo, exigir respeito por quem produz a comida do povo.
Sim, eu convidaria a Anitta para comer um churrasco daqueles que só os gaúchos sabem fazer. Dava-lhe um mate quente, tocava uma música sertaneja e puxava uma prosa caipira. Talvez lhe falte isso, uma oportunidade de conhecer a raiz do Brasil.
Se ela quisesse cantar um funk, paciência. Afinal, uma boa causa exige sacrifício.
Por Xico Graziano – 67 anos, é engenheiro agrônomo e doutor em Administração. Foi deputado federal pelo PSDB e integrou o Governo de São Paulo. É professor de MBA da FGV e sócio-diretor da e-PoliticsGraziano. O articulista escreve para o Poder360 semanalmente, às quartas-feiras.